Mecanismos para facilitar a contratação de financiamentos

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Guilherme Araujo Drago / Advogado

A indústria de construção naval nos últimos anos tem recebido incentivos dos mais diversos, tanto em razão do seu caráter estratégico quanto do seu potencial para fomentar a criação de outras empresas, que estabelecem vínculos decorrentes de contratos de fornecimento e de contratos de associações, criando uma verdadeira cadeia de fornecedores.

Normalmente tais negócios nascem pequenos ou médios e vão conquistando mercado na exata medida em que conseguem investir para diversificar sua base de clientes e explorar novos mercados.

Os investimentos destes negócios que compõem a cadeia de fornecedores da indústria naval normalmente têm sua origem nos lucros gerados pela atividade, no que pese os programas de incentivo ao financiamento atualmente existente para este setor, como os FDICs (Fundos de Investimento em Direitos Creditórios) e o PROGREDIR, ambos fomentados pela Petrobras e que suprem a cadeia de fornecedores basicamente com capital de giro.

No entanto, não é incomum que o financiamento de um banco comercial no Brasil seja a única opção do pequeno e médio empresário em busca de viabilizar suas atividades. Embora o financiamento junto aos entes de fomento seja o grande sonho de qualquer empresário, o normal é que os bancos de varejo, privados ou públicos, atuem como os responsáveis pelos primeiros empréstimos que irão gravar o balanço da sociedade em início de atividade.

Os bancos de varejo emprestaram para as empresas em setembro de 2010 recursos da ordem de R$ 469,2 bilhões, conforme dados do Banco Central do Brasil, sendo que, deste montante, as operações envolvendo empréstimo na forma de capital de giro correspondeu a R$ 249,088 bilhões. Este valor é a quase o quádruplo dos desembolsos efetuados até setembro de 2010 pelo BNDES, o mais relevante ente de fomento da atividade econômica no Brasil, que foram da ordem de R$ 128 bilhões.

Para as sociedades que faturam até dez milhões de reais e não lidam com inovação, atualmente o crédito para financiamento da empresa tem origem nos bancos de varejo, que, inclusive, são responsáveis pelos repasses de algumas das linhas de crédito do BNDES.

No entanto, mesmo junto a esses bancos, por vezes torna-se difícil ao pequeno e médio empresário conseguir recursos para alavancar suas atividades e, normalmente, tal dificuldade está relacionada à ausência ou fragilidade das garantias apresentadas quando é feito o pedido de empréstimo.

Naturalmente não é a única dificuldade. Concorre com a ausência de histórico financeiro ou porque se trata de uma nova sociedade, ou em razão de práticas inadequadas dos sistemas contábeis, bem como pela impossibilidade de elaborar um plano de negócios eficientes, no qual seja demonstrado como os recursos serão usados.

Não obstante, quando a companhia não apresenta garantias convincentes aos bancos, um plano financeiro que demonstre os benefícios e receitas que podem ser obtidos através do financiamento pretendido, ou bons indicadores econômicos, especialmente os referentes à relação dívida/patrimônio líquido, dificilmente serão suficientes para garantir a contratação do financiamento.

Quando se fala em mecanismos de garantia, além daqueles conhecidos e sempre exigidos pelos bancos em qualquer empréstimo, como o aval dos sócios em uma nota promissória assinada pela sociedade que está captando recursos ou as garantias reais, como a hipoteca e a alienação fiduciária em garantia, há também operações societárias que podem ser usadas com este propósito, contratos que buscam tal fim apesar de, originalmente, não terem a função de garantia e instrumentos cuja finalidade é gerar obrigações, conexas ou acessórias à obrigação de pagar o principal e os juros do financiamento. O descumprimento de tais obrigações agrava a situação do credor sem provocar um inadimplemento definitivo.

Dentre as garantias, tem ganhado a preferência das instituições financeiras, a garantia denominada “alienação fiduciária”. Tal modalidade de garantia revela-se mais vantajosa para os bancos, tendo em vista que, por transferir efetivamente a propriedade da coisa dada em garantia ao banco enquanto não quitada a dívida em sua integralidade, não integrará o bem a massa falida caso a insolvência do devedor seja declarada, sendo, por tal motivo, mais segura do que as demais formas de garantia sob a ótica do banco credor.

No entanto, é normal nos defrontarmos com a seguinte situação: inexistência de bens para oferecer em garantia somada à insuficiência do patrimônio de quem pretenda prestar fiança ou dar aval. Nestes casos, quando não é possível entregar uma garantia típica ou quando ela não é interessante para o banco, como é possível contratar os empréstimos para viabilizar a atividade do empresário?

Apesar de não existir uma resposta universal para esta pergunta, eis que vai depender do tipo de negócio que busca financiamento, é possível afirmar que a visão do banco é calcada num padrão de expectativa de conseguir recuperar o valor emprestado acrescido da remuneração combinada. Se os mecanismos apresentados pelo empresário permitem ao banco ter esta percepção, não vai importar se a garantia apresentada é uma das típicas, uma atípica ou uma aparente.

Assim, por exemplo, se o negócio permite certa previsibilidade quanto ao comportamento da receita gerada por um determinado negócio, caso atual da cadeia de fornecedores vinculado à construção naval, e esta receita é, parcialmente, tratada como objeto de um contrato de vinculação de receitas, tal contrato pode constituir um meio de garantia que venha a permitir ao banco fornecer um financiamento para a companhia.

O mesmo ocorreria, por exemplo, com um acordo de acionistas, contrato cujo objetivo é regular as relações entre os sócios ou acionistas, onde ou haja previsão de que os sócios devem realizar aportes de recursos na sociedade em datas próximas às do vencimento das parcelas do empréstimo ou a obrigação de manter determinados indicadores financeiros até o pagamento integral do empréstimo. Apesar de se tratarem de garantias aparentes, são instrumentos que fornecem ao banco, usualmente, a perspectiva de recuperar o capital emprestado ao lhe conceder o instrumento necessário à fiscalização da atividade.

Há possibilidades, portanto, mas o trabalho de estruturar as garantias deve contar com advogados que saibam avaliar as oportunidades, especialmente porque é preciso conhecer o negócio para analisar a viabilidade da criação de uma garantia diversa daquela prevista em lei. Especialmente quando se trata de pequenas e médias empresas, é necessário avaliar com cuidado a possibilidade de lançar mão de mecanismos que forneçam ao banco a segurança que ele busca para conceder o empréstimo para não prejudicar a atividade objeto de financiamento.

O setor naval, em especial, por contar com diversos mecanismos de incentivo atualmente, permite uma maior flexibilidade e garante aos empresários que contam com uma boa equipe de apoio uma negociação mais vantajosa ao menos no tocante ao comprometimento do patrimônio da sociedade empresária e de seus sócios para angariar recursos.