Enrique Peña Nieto: “Vamos reproduzir o modelo da Petrobras”

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CLÁUDIA DARÉ, DE LEÓN (MÉXICO)

Um sorriso branco e um topete impecável compõem a imagem de Enrique Peña Nieto. Ex-governador do Estado do México entre 2005 e 2011, o advogado com pinta de galã, de 45 anos, é o sangue novo do centrista Partido Revolucionário Institucional (PRI), há tempos desgastado por velhas lideranças. Salvo algum improvável erro de campanha, ele será escolhido presidente nas eleições de 1º de julho – as pesquisas lhe dão em torno de 50% dos votos. Peña Nieto se aproveita da insatisfação dos mexicanos com a guerra ao tráfico de drogas promovida pelo presidente Felipe Calderón, do Partido da Ação Nacional (PAN). Ela fez mais de 50 mil mortos em cinco anos sem conseguir dobrar os grandes cartéis. Junte-se a isso o apelo midiático de Peña Nieto, com seus jingles de tecnopop e o apoio das principais redes de TV.

Casado pela segunda vez e pai de sete filhos, o Bombón (gíria equivalente a homem “gostoso”), como é chamado por suas admiradoras, conversou com ÉPOCA.No mesmo dia, os corpos de três jornalistas foram encontrados mutilados em sacos de lixo, no leste do país. Peña Nieto diz que não priorizará a perseguição aos chefões do tráfico, mas formará militares para enfrentar melhor a criminalidade cotidiana.

Se o senhor for eleito, os mexicanos recolocarão no poder um partido que mandou no país durante 71 anos, de 1929 a 2000. O senhor atribui isso a um mérito do PRI ou à incompetência dos últimos governos do PAN?

 

Enrique Peña Nieto – Essa é uma aspiração que espero que se materialize. É uma vitória do partido que tem a ver com vários fatores. Primeiro, os acertos do PRI nos governos dos Estados, onde ganhamos reconhecimento. Claro, há também o fracasso dos governos de alternância. Eles não corresponderam às expectativas da sociedade, que se viu desgastada e frustrada. Entre muitos outros, esses são dois fatores centrais que nos colocam nesta condição de realmente conseguir atingir essa importante meta.

 

O México registra níveis de criminalidade fora de controle em meio a uma guerra contra os narcotraficantes. Só em 2011, 22 mil estrangeiros foram sequestrados, especialmente imigrantes ilegais em passagem pelo país…

Nossa luta para reduzir a violência, neste momento, está concentrada em três pontos: o homicídio, que vemos de maneira quase frequente e cotidiana nas ruas, o sequestro e a extorsão. São os três delitos que hoje mais afetam a sociedade de maneira geral. Acredito que a estratégia a seguir seja combater com uma frente comum a violência estendida pelo país. O que busco é redefinir uma estratégia que mantenha o que tem funcionado bem na atual gestão, mas fazer o que ainda não conseguiram: organizar uma frente nacional com a participação de todos os níveis governamentais. Temos um grande problema com os ministérios públicos, a Procuradoria de Justiça. Vamos fortalecer os três níveis de governo, dando ferramentas para que possam fazer seu trabalho. O que mais agrava a situação de violência é a falta de eficácia do governo para combater a impunidade. Quem falta com a lei tem de ser punido, e esse é meu grande objetivo ao presidir o Estado mexicano.

Mas como será essa estratégia?

Primeiro, a profissionalização das polícias. Vamos trocar o propósito de ir contra os grandes “capos” do narcotráfico e partir para combater a violência diretamente.
Vamos criar uma “gendarmería” (força policial militar), composta de militares que estão nas ruas para combater o crime, mas não têm formação adequada para exercer essa função. São 50 mil soldados. Vamos treinar esses militares e institucionalizar seu trabalho. Essa força começará pelos municípios mais devastados pela violência e se estenderá pouco a pouco.

 

Em quanto tempo isso vai acontecer?
A incorporação dos soldados deve ser progressiva. Prevemos uma preparação de dois anos.

Conhecido por seu apelo midiático, Peña Nieto acena para eleitores em visita a León, na região central do México (Foto: Mario Armas)
 
A maioria dos analistas diz que o problema de tráfico de drogas não diminuirá se não houver uma cooperação maior com países mais pobres da América Central, que são porta de entrada para a droga consumida nos Estados Unidos. Como o senhor avalia a ajuda dos EUA à região?
 
Em primeiro lugar, acredito que deveria haver uma cooperação do México e também dos Estados Unidos com os países da América Central, com o intuito de contribuir para o progresso e desenvolvimento dessas nações, porque é isso o que vai frear a violência e a gente dedicada ao crime organizado. Essa é uma situação que também temos no México, consequência, em parte, da falta de crescimento econômico e de oportunidades. Acredito que é um esforço que exige uma colaboração multinacional, mas com respeito à soberania de cada povo.

O senhor é a favor da legalização das drogas?

Não sou a favor de legalizar as drogas, mas tampouco sou contra. Sou a favor de abrir um amplo debate sobre o tema, porque não me parece uma solução para o problema que temos, e sim mais uma resposta à frustração da sociedade por não ver resultados mais concretos. Acredito que legalizar as drogas possa ser a porta de acesso ao consumo de drogas mais pesadas e trazer mais danos à sociedade e à saúde.

O senhor vê o Brasil como um aliado ou um concorrente na América Latina?

Mais que competir, temos de estabelecer alianças estratégicas para que a América Latina possa alcançar maior competitividade perante o mundo e os países que fazem parte dessa região possam realmente ser beneficiados.

 

Há alguma política do governo brasileiro que o senhor pretenda reproduzir no México?

Sem dúvida, o modelo da Petrobras. A reforma de abertura para o setor privado é um modelo que queremos trazer ao México. E também o BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social). O México tem de conseguir maior extensão de crédito para os mexicanos. O Brasil empresta quase 50% de seu Produto Interno Bruto (PIB), e o México só empresta 23%. Há uma brecha aí, e só vamos conquistar isso com uma regulação bancária que favoreça maior crédito e um banco nacional de desenvolvimento mais agressivo para conquistar o crescimento econômico.

O senhor vai combater a estrutura monopólica do país? O que pretende mudar?

Quero impulsionar o crescimento econômico do México e tenho realmente me comprometido com isso. Meu desejo é que minha gestão seja marcada por ser um Estado promotor da competitividade. Quero promover a concorrência nos mercados de nosso país, para que os mexicanos tenham opções de produtos e serviços de maior qualidade e de melhor preço.

O ex-presidente brasileiro Luiz Inácio Lula da Silva defendia uma parceria entre a Petrobras e a Pemex, a estatal petrolífera do México, para explorar recursos em outros países. O senhor tem interesse nesse negócio?

Esse é um tema a ponderar, mas o primeiro passo, o mais importante neste momento, é impulsionar as reformas para alcançar a abertura da Pemex à participação do
setor privado. Conseguir que a Pemex seja uma empresa muito maior e mais produtiva e, a partir daí, pensar em fazer alianças estratégicas com outras empresas.

A presidente Dilma Rousseff impôs recentemente um limite de importação de automóveis mexicanos para o Brasil. O senhor pretende rever os termos desse acordo?

O que temos de buscar nesse terreno e em outros âmbitos é, mais que a colaboração, uma relação comercial do México com toda a América Latina. Acredito que o Brasil, sem dúvida, seja um país líder nessa região. Vamos buscar maior interação comercial e maior presença de produtos mexicanos no Brasil, como também guardar reciprocidade com as empresas brasileiras presentes aqui.

 

Qual é a posição do senhor em relação à decisão do governo argentino de nacionalizar a YPF e retirá-la do controle da espanhola Repsol, da qual a Pemex tem quase 10% das ações?

Acredito que a desapropriação e a forma como foi adotada não é a adequada para gerar confiança e mais investimentos produtivos em um país. Mas, no entanto, sou absolutamente respeitoso com relação à decisão soberana que tomou este país.

ÉPOCA – Quais são os políticos que o inspiram, tanto mexicanos quanto estrangeiros?
Peña Nieto – Há vários momentos da história do México e do mundo que nos deixaram lições do que se deve fazer para conseguir maior eficácia em uma gestão. No México tenho a inspiração dos homens da ação de independência de nosso país, como José Maria Morelos (1765-1815, um dos líderes da luta pela independência do México da Espanha), personagem visionário que, sem dúvida definiu o grande problema do México, ainda vigente em nossos dias, que é a enorme desigualdade dessa sociedade de contrastes. Ele disse que o governo deveria moderar a opulência e a indiferença. E, de épocas mais modernas, vejo em Adolfo López Mateos (1909-1969), ex-presidente de nosso país (entre 1958 e 1964) e “mexiquense” (natural do Estado do México) como eu. Ele forjou instituições que hoje servem a todo México, como o Instituto de Segurança Social dos Trabalhadores.

 

Quem é Enrique Peña Nieto por Enrique Peña Nieto?

Um homem de compromisso e que deseja pôr a eficácia como centro da sua gestão de governo.

Ser bonito rende votos? Como se sente quando as mulheres nos seus comícios o chamam de “bombón”?

Me sinto muito lisonjeado e aprecio muito, mas o que quero é que distingam minha campanha como um compromisso que faço, com distintos propósitos, para que o México tenha melhores condições. A única coisa que aspiro é dar o melhor de mim através da experiência que adquiri como governador de estado e que vou colocar a serviço do país.