Quarentena afeta exportação de frutas e expõe gargalos logísticos do setor no Brasil

0
482
IMPRIMIR
O Brasil é o terceiro maior produtor de frutas do mundo, mas apenas o 23º no ranking de exportadores, segundo a Abrafrutas (Associação Brasileira de Produtores e Exportadores de Frutas e Derivados). A venda do produto nacional ainda esbarra em questões logísticas, cenário que foi agravado com a pandemia de coronavírus.

Cerca de 10% dos produtos exportados dependem de aviões para chegar ao destino. Com o fechamento de aeroportos durante a quarentena, frutas sensíveis e com menor tempo de vida deixaram de embarcar.“A carga geralmente vai nos porões de aviões de passageiros.Como não tivemos os voos, consequentemente não tivemos essa exportação”, afirma Guilherme Coelho, que é presidente da Abrafrutas.

No primeiro semestre de 2020, o volume de frutas exportado pelo país caiu 5% em relação ao mesmo período do ano passado, totalizando 399,8 milhões de quilos. Alguns itens, como pêssegos e caquis, sofreram mais, com quedas acima dos 50%. A expectativa é de recuperação no segundo semestre quando, tradicionalmente, há maior volume de exportação.

Guilherme Coelho produz há 25 anos mangas e uvas em sua fazenda de 200 hectares em Petrolina, Pernambuco. Ele criou o plantio já de olho no potencial de venda para o exterior e hoje envia seus produtos para destinos como Estados Unidos e Inglaterra.

Para isso, o agricultor teve de obter certificados internacionais obrigatórios de boas práticas de higiene, manuseio da fruta e cuidados com a mão de obra.

Como são produtos perecíveis e de vida útil curta, toda a cadeia de transporte tem de funcionar muito bem, diz Luiz Roberto Barcelos, sócio da Agrícola Famosa, em Mossoró, no Rio Grande do Norte.“Precisamos de portos com boa estrutura. Além disso, a liberação de carga pela Receita Federal e pelo Ministério da Agricultura tem que correr bem para o navio não sair sem a fruta por causa de burocracia.”

Para exportar os melões produzidos em sua propriedade, Barcelos também recorre ao transporte marítimo. Quase 90% da produção é comprada por países europeus, entre eles Inglaterra, Holanda e Espanha. São 8.000 hectares de plantação, onde ele também cultiva melancias.

“Ter dois mercados, o interno e o externo, é melhor do que ter só um. Ainda mais para quem trabalha com produto fresco, que é muito perecível”, afirma Barcelos, que exporta seus produtos desde 1995.

As exigências fitossanitárias e as tarifas da exportação, contudo, acabam assustando boa parte dos produtores brasileiros.

Para Barcelos, falta no setor a cultura de vender para fora. “Fica difícil porque o Brasil quase não tem acordos bilaterais. São poucos os mercados abertos para gente”, diz o produtor, que reclama também da falta de registro por órgãos federais de defensivos usados na lavoura, o que impede a obtenção dos documentos para exportação.

Entre as frutas mais resistentes, a maçã tem 5% a 10% da sua safra exportada via navio. Chega a passar 60 dias em uma embarcação para chegar em Bangladesh, por exemplo. Se o destino for a Europa, são cerca de 20 dias de viagem.

“É bom exportar porque nos obriga a manter os melhores padrões. A exigência é tremenda”, afirma Pierre Nicolas Pérès, presidente da ABPM (Associação Brasileira de Produtores de Maçã).

O setor fruticultor brasileiro tenta conquistar novas fronteiras. Em breve, melões nacionais devem ser enviados à China. Há negociações também para vender avocado para o Chile e maçã para a Colômbia.

Durante a pandemia, houve um crescimento na venda de cítricos, tanto para dentro quanto para fora do país. Os produtores relacionam a alta à maior procura por alimentos fontes de vitamina C.

As exportações de laranja tiveram alta de 132% no primeiro semestre deste ano em relação ao mesmo período de 2019, segundo a Abrafrutas. A venda de tangerinas para o exterior aumentou 158%, a de limões e limas, 12%, e a de kiwis, 25%.

“Não sei o que vai ser do mundo depois da pandemia, mas sei que as pessoas vão comer mais fruta porque não tem nada mais saudável”, diz Coelho.

Fonte: Folha SP