Artigo: Buscando o campeão

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Por Flávio Tavares, jornalista e escritor


O ano termina daqui a 34 dias e já é tempo de começarmos a eleger, comcalma, o maior escândalo de 2011 no Brasil. A regra universal de escolher, acada fim de ano, as grandes figuras e acontecimentos tornou-se inútil depoisque a corrupção e os ladravazes passaram a dominar a sociedade. Hoje, só valesaber qual “o maior dos maiores escândalos”, o mais corrosivo e putrefato, quereuniu maior devassidão, incentivou o suborno, multiplicou a propina e levou àdestruição. Se disserem que “todos”, não vale! Há sempre um primeiríssimo paraser campeão.

Desde já, confesso minha predileção: o escândalo da Chevron, a empresanorte-americana que “errou” ao perfurar petróleo na rocha submersa no mar, naBacia de Campos, a 200 quilômetros da costa do Estado do Rio de Janeiro, quandobuscava o pré-sal, sem autorização nem qualificação. Ali estão todas assafadezas conhecidas ou não, todos os crimes previstos ou possíveis, encobertosou visíveis. As mentiras da empresa, o desprezo pela natureza e a arrogância deseus dirigentes pelo nosso país, a omissão e negligência de ministros e altosfuncionários, a simulação dos laudos técnicos ou o silêncio em denunciar quenenhuma norma se cumpria e que o mar iria degradar-se por derrame de petróleo –tudo isto é demasiado para ser apenas soma de coincidências.

Por que tanto desleixo? Terá corrido propina para que o Ministério das Minas eEnergia e a Agência Nacional do Petróleo (ANP) jamais exigissem um “plano decontingência” para enfrentar desastres em algo tão perigoso? O petróleo – omaior negócio do mundo – estará isento de corrupção? Ou suas atividades são tãodiversificadas e o dinheiro é tanto, que o suborno se esvai pelo ralo, comoágua em cano furado no banheiro? Em 2010, por exemplo, o faturamento mundial daChevron beirou os US$ 200 bilhões.

A também norte-americana Transocean foi subcontratada para perfurar, mesmoimplicada no terrível derrame do Golfo do México, que afetou a costa sul dosEUA no ano passado. Ninguém piou. Nem a Petrobras, sócia minoritária naexploração da área.

A Chevron mentiu sobre o início do derrame e o volume do vazamento e adulterou,até, as imagens filmadas da mancha de óleo, enviando à ANP apenas parte delas.Na Câmara dos Deputados, o presidente da empresa no Brasil, falando em inglês,culpou “a banda larga” da internet pelas “imagens deformadas” (ou mentirosas)fornecidas ao governo brasileiro. Desculpou-se e disse que “assumia asresponsabilidades” do desastre.

E daí? O mar sabe disto? A ANP proibiu a Chevron de iniciar novas perfurações,mas congratulou-se pela “diminuição” da mancha. Outra falácia: dispersada comágua, a mancha afunda e, misturada à areia no leito do mar, aglutina-selentamente, desequilibra a composição aquática e elimina as bactérias que“limpam” a matéria orgânica. Em suma: o óleo mata a vida submarina.

A empresa norte-americana está classificada para operar, até, nas profundezasabissais do pré-sal, mas, só agora, a ANP concluiu que não tem “adequadoequipamento”. O escândalo é tanto, que vários órgãos públicos – ANP, Ibama,Ministério do Meio Ambiente ou secretaria estadual – ameaçam com multas que,somadas, superam R$ 100 milhões. Isto (que é muito) em verdade nada é,comparado aos lucros petrolíferos. E há um detalhe: as multas nunca são pagas,são apenas declaratórias. As empresas sancionadas apelam e recorrem, comprotelações eternas.

Nenhum escândalo o supera. Nem o das queimadas em Mato Grosso ou as fraudes egrotescas bravatas do ministro Lupi. Nem o de três dias atrás, no Ministériodas Cidades, envolvendo R$ 700 milhões.