Corrado Clini, ministro do Meio Ambiente da Itália

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O ministro do Meio Ambiente da Itália, Corrado Clini, tem experiência em negociações ambientais no Brasil: esteve no Rio em 1992, na Eco-92, e retorna agora, 20 anos depois, para liderar a delegação italiana na Rio+20. Antes da conferência, entretanto, Clini esteve em Brasília para inaugurar a “Embaixada verde”, um projeto que promove a cooperação de empresas italianas na área de energia renovável com o governo brasileiro, e conversou com a equipe de ÉPOCA, por telefone, sobre os preparativos para a conferência no Rio.

Segundo Clini, a Rio+20 deve ser considerada como o pontapé inicial para a economia verde, criando uma agenda para investir em energias renováveis, eficiência energética e redução de consumo de combustíveis fósseis. Clini diz acreditar que a economia verde é o caminho para superar a grave crise financeira enfrentada não só pela Itália, mas pela maioria dos países da Europa. O ministro também comentou sobre o recente acidente do navio Costa Concordia, que por pouco não derramou combustível no oceano. Segundo Clini, não há mais riscos ambientais, e o governo italiano trabalha agora para retirar o navio do mar.

ÉPOCA – O senhor liderou a delegação italiana na Eco-92, e vai liderar novamente agora, na Rio+20. Nesses 20 anos, o que mudou nas negociações internacionais?
Corrado Clini – Tudo mudou! [risos]. Em 1992, o formato era o seguinte: um grupo de países desenvolvidos –Canadá, países da União Europeia, Japão – que se encontrava com o mundo em desenvolvimento, para discutir como buscar desenvolvimento sustentável de acordo com o princípio de responsabilidades comuns, porém, diferenciadas. Na época, o comprometimento para proteger o meio ambiente era principalmente uma tarefa do mundo desenvolvido, e os países em desenvolvimento estavam esperando ajuda econômica e tecnológica. China, Brasil, Índia, Indonésia, África do Sul, eram países em desenvolvimento, com poucos recursos. Em 2012, o mundo mundou, e agora esses países são economias com um crescimento muito rápido. A China é o maior consumidor de energia do mundo, o Brasil é a sétima economia do mundo. A distribuição das responsabilidades, hoje, é diferente daquela em 1992.

Eu acredito que a Rio+20 está mostrando a liderança dos países emergentes. O Brasil hoje é um líder do processo, não só por ser o país-sede, mas porque é uma economia muito importante no mundo, e está fazendo com que a comunidade internacional olhe para o futuro, em uma nova visão de cooperação e solideriedade baseada em objetivos comuns. O mais importante desses objetivos é como buscar crescimento econômico sem desperdiçar ou afetar recursos naturais e com o desenvolvimento de energias alternativas, para reduzir o consumo de combustíveis fósseis responsáveis pelas emissões de carbono. Isso significa que estamos discutindo política industrial, cooperação tecnlógica, inovação e novas regras para o comércio mundial, para a economia. O desafio não é ambiental, é um desafio que envolve todas as questões na mesa sobre crescimento econômico. A Rio+20 será o ponto de largada de uma agenda global para a economia verde na próxima década. Não é a mesma agenda de 1992, que era mais sobre proteção ambiental, mas uma agenda para a economia verde.

ÉPOCA – O senhor falou que, na Eco-92, o meio ambiente era responsabilidade dos países desenvolvidos. Isso significa que, agora, Brasil, China, os países em desenvolvimento deveriam se comprometer mais?
Clini – Eu posso dizer que China e Brasil estão completamente envolvidos no desenvolvimento de novas tecnologias e na redução de emissões. Se você vir os investimentos para energias alternativas, vai perceber que a China investiu US$ 50 bilhões em 2011. A Índia investiu US$ 18 bilhões, com um aumento de 52% comparado com 2010, e Brasil investiu mais ou menos US$ 10 bilhões, com um aumento de 15% em comparação a 2010. E o Brasil, em particular, tem uma matriz energética de baixa emissão de carbono.

China, Índia e Brasil estão investindo em inovação, e mais do que os países europeus”
Corrado Clini

A questão não é envolver China ou Brasil em compromissos para a redução de emissões, mas como ligar os esforços para o desenvolvimento de novas tecnologias com regras no mercado global para apoiar uma nova economia. Porque nós precisamos de mais investimentos, de novas soluções para o crescimento da economia e limitar o crescimento de emissões. Se nós trabalharmos para apoiar o crescimento econômico com sistemas de tecnologia capazes de reduzir a intensidade energética da economia, nós poderemos ter ao mesmo tempo crescimento econômico e proteção do meio ambiente. China, Índia e Brasil estão fazendo esses investimentos em inovação, e estão investindo mais do que os países europeus, por exemplo. Na Itália, nós também precisamos investir em novas tecnologias para estimular nossa economia.

ÉPOCA – A Itália, assim como grande parte dos países da zona do euro, está enfrentando uma forte crise econômica. Como fazer investimentos em novas tecnologias e energias renováveis nessa condição?
Clini – Essa é a pergunta certa. A crise econômica na Itália está ligada à competitividade global. Nós não podemos continuar a produzir bens que, comparados com os da China, ou do Brasil, ou da Índia, não são competitivos. Não só por causa dos custos, mas porque o mercado interno de Índia, China, Brasil, está direcionando os investimentos nesses países mais do que nas economias europeias. Para poder competir nessa economia globalizada, nós precisamos de inovação. E a inovação é verde porque está relacionada com a redução da poluição, com uma matriz energética renovável. A inovação, para um país como a Itália, também está na proteção dos recursos naturais, porque isso incentiva o turismo, um setor importante da economia italiana. Acreditamos que a economia verde é o caminho para superar a crise econômica.

Acreditamos que a economia verde é o caminho para superar a crise econômica”
Corrado Clini

ÉPOCA – Uma das ideias que devem ser discutidas na Rio+20 é a criação de Objetivos de Desenvolvimento Sustentável. Qual a posição da Itália a respeito desses objetivos?
Clini – Nós apoiamos a proposta de objetivos do desenvolvimento sustentável. Isso porque pode ser o pano de fundo para a construção de uma agenda para a economia verde. Uma das diferenças entre 1992 e 2012 é a importância do setor privado. Eu posso dizer que, ao abordar inovação, soluções verdes, as companhias ao redor do mundo são mais efetivas que os governos. Acho que, na Rio+20, nós devíamos ligar os objetivos de desenvolvimento sustentável, um tipo de objetivo tipicamente público, com os investimentos já adotados pelo setor privado, para usar essas metas como uma base para orientar os investimentos privados. Se nós formos capazes de fazer isso, acho que a Rio+20 será um sucesso.

ÉPOCA – Nem todo mundo é tão otimista assim. Muitos acham que a conferência não terá sucesso, lembrando exemplos que foram vistos como fracasso, como a conferência do clima em Copenhague.
Clini – Em Copenhague, as discussões estavam focadas em um acordo, um tratado global. Na Rio+20, nós não estamos discutindo um tratado. Nós estamos discutindo uma agenda, uma estrutura que vai ligar objetivos para o setor público aos investimentos privados. É totalmente diferente. Seria um erro esperar um tratado global no Rio de Janeiro. A Rio+20 será um sucesso se nós formos capazes de concordar com uma agenda para a economia verde, mostrar que uma nova economia é possível. Podemos fazer isso se nos basearmos em experiências que estão acontecendo ao redor do mundo.

ÉPOCA – Uma última pergunta, saindo um pouco do tema da Rio+20: a Itália enfrentou o risco de um desastre ambiental quando o navio Costa Concordia naufragou. Como o Ministério do Meio Ambiente lidou com esse problema?
Clini – Nós nos envolvemos totalmente no caso, e adotamos três medidas. Primeiro, criamos uma regra limitando o tráfego de cruzeiros muito longe de zonas costeiras, para evitar acidentes similares no futuro. Segundo, nós trabalhamos duro para capturar todo o combustível que estava no navio. Esse era o principal risco para o ambiente, para o oceano, e nós conseguimos coletar todo o combustível com sucesso. Hoje, não há mais riscos ambientais. Terceiro, nós estamos trabalhando para remover o navio. É uma tarefa complicada, mas estamos trabalhando com o prazo de conseguir remover até o final do ano.