Quem é o prático, o “manobrista” de navios que evita acidentes como o de Suez

0
298
IMPRIMIR
O profissional mais bem pago do porto assume o comando de embarcações gigantescas para manobrá-las em canais e estuários estreitos – e navios cada vez maiores, com lemes cada vez menores, tornam tudo mais difícil / José Rodrigues/ Praticagem de Santos

Você já sabe: um navio de 400 metros e 200 mil toneladas encalhou no Canal de Suez em seu caminho para o porto de Roterdã, na Holanda. A passagem em território egípcio que liga o Mar Vermelho ao Mar Mediterrâneo é pivotal para a marinha mercante, pois evita que as embarcações precisem dar a volta pelo Cabo da Boa Esperança, no sul do África – ou que façam a rota pelo outro lado da Terra cruzando as eclusas do Canal do Panamá, cuja travessia é um pouco mais cara e demorada (entenda como funciona o Canal do Panamá neste infográfico).

Aquela imagem que abre a matéria não é uma pintura abstrata. É o casco de um navio. O prático chega de lancha, faça chuva, faça sol, de noite ou de dia. Ele precisa escalar essa escadinha de corda e madeira, nem sempre em um estado de conservação exemplar, para acessar o navio na boca do porto. Lá em cima, faz tudo ao mesmo tempo: se comunica com a casa de máquinas, com o timoneiro, que move o leme, com o comandante e com os rebocadores – aqueles barcos pequenos, invocados e muito potentes que empurram os naviozões para lá e para cá.

Tudo, no mundo náutico, é grande, pesado, caro e coberto por seguradores. Por causa da importância econômica do setor, o esforço para evitar um incidente desse gênero é enorme (e dá frutos: acidentes assim são raríssimos). É por isso que o profissional mais importante do porto é o prático – um especialista em manobrar navios de grande porte, fazê-los transpor canais estreitos e atracá-los com segurança.

Quem conta como todo esse processo funciona é o prático Carlos Alberto de Souza Filho, membro do Conselho Nacional de Praticagem (Conapra) que trabalha no porto de Santos (SP), responsável por  uns 30% do comércio exterior brasileiro.

O prático conhece o trecho de litoral em que trabalha na palma da mão. Navegar em águas confinadas é um desafio bem diferente do encarado pelos comandantes, que podem passar mais de um mês entre o céu e o mar, percorrendo linhas retas no mapa. Para estacionar um monstrão centenas de metros, eles precisam conhecer as correntes marítimas, os ventos, os bancos de areia e as pedras que atrapalham a circulação na região pela qual são responsáveis. O canal de Suez comporta, atualmente, mais de 90 navios por dia – e todos levam um ou mais práticos à bordo para garantir a travessia.

Uma das principais pedras no sapato da praticagem contemporânea são os lemes. O leme é a peça posicionada na traseira do navio que gira para a direita quando o navio precisa ir para a esquerda – e vice-versa. A embarcação faz a curva por causa do atrito do leme com a água, mas esse atrito se traduz, é claro, em um maior gasto de combustível – que, você já viu, não é barato. Por causa disso, com o passar dos anos, os navios aumentaram e os lemes diminuíram.

Em alto mar, isso não é um problema, porque os gigantes cheios de contêineres não precisam fazer curvas bruscas. O encolhimento dos lemes só quebra as pernas dos práticos, porque os impede de manobrar com mais precisão. Navios de 280 metros fabricados apenas alguns anos atrás tinham lemes com 90 m² ou 92 m² – os mais recentes, que superam os 300 metros de comprimento, podem vir com lemes de apenas 70 m². “Quando eu cheguei em Santos, há 15 anos, estavam chegando os navios de 280 metros”, conta Carlos. “Depois vieram 295 m, estamos em 340 m e agora 366 m [o porto de Santos acabou de ser homologado para receber embarcações de 360 m].”

Fonte: Revista SUPERINTERESSANTE

 A íntegra:

https://super.abril.com.br/sociedade/quem-e-o-pratico-o-manobrista-de-navios-que-evita-acidentes-como-o-de-suez/