Escassez de matéria-prima é a nova realidade do mundo e levará tempo para ser resolvida

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A falta de mercadorias devido à pandemia – de chips a material de construção – já deveria ter sido resolvida. Em vez disso, o mundo tem aprendido uma lição sobre os efeitos em cascata da interrupção da cadeia de suprimentos

por Peter S. Goodman e Keith Bradsher, The New York Times 

Como a maioria das pessoas dos países desenvolvidos, Kirsten Gjesdal há muito tempo não via nada demais em poder encomendar tudo o que precisasse e, depois, ver as mercadorias chegarem, sem precisar pensar nas fábricas, nos navios porta-contêineres e nos caminhões envolvidos na entrega. Isso é coisa do passado.

Em sua loja de utensílios para cozinha em Brookings, no Estado norte-americano de Dakota do Sul, Kirsten desistiu de estocar jogos americanos e cansou de dizer aos clientes que não fazia ideia de quando novas peças chegariam. Há pouco tempo, ela recebeu uma tampa de panela que havia comprado há oito meses. Ela já está acostumada a pagar taxas extras para cobrir os custos cada vez maiores de envio das mercadorias que compra. E já fez os pedidos de itens para o Natal, como guirlandas e assadeiras. “É uma loucura”, disse ela. “Com certeza não estamos voltando ao normal.”

Um navio gigante ficou encalhado no Canal de Suez no início deste ano, interrompendo o tráfego em uma hidrovia vital que conecta a Europa à Ásia durante uma semana e adicionando mais caos nos mares. O mesmo aconteceu após uma série de fechamentos temporários de portos importantes na China devido ao novo coronavírus.

O mundo aprendeu uma lição dolorosa sobre quão interconectadas as economias estão através de grandes distâncias, com atrasos e escassez em qualquer ponto e que isso está reverberando em quase todos os lugares.

Um contêiner de transporte que não pode ser descarregado em Los Angeles porque muitos trabalhadores portuários estão em quarentena é um contêiner que não pode ser carregado com soja em Iowa, deixando os compradores na Indonésia esperando e possivelmente provocando uma escassez de ração animal no sudeste asiático.

A escassez de contêineres foi agravada por atrasos no descarregamento de cargas nos portos americanos, pois os trabalhadores ficaram em casa para retardar a propagação do novo coronavírus.

Em maio, a China fechou um grande porto que recebia navios porta-contêineres perto de Shenzhen – uma das principais cidades industriais do país – depois de um pequeno surto de uma variante do coronavírus. O porto levou semanas até retomar as operações.

Então, em meados de agosto, as autoridades chinesas fecharam um terminal importante para carga e descarga de contêineres perto da cidade de Ningbo, depois que um funcionário foi diagnosticado com covid-19. Ningbo é o terceiro maior porto de contêineres do mundo, então, seu fechamento teve o potencial de crescer como uma bola de neve e se transformar em um acontecimento global, até mesmo ameaçando o fornecimento de mercadorias para as lojas americanas a tempo das vendas da Black Friday e do dia de Ação de Graças.

No dia 15, o terminal de Ningbo voltou a funcionar. Mas a decisão da China de fechá-lo por causa de um único caso de covid-19 repercutiu como um aviso de que o governo talvez fechasse outros portos.