Tubarões: é culpa do porto de Suape?

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Mais de trinta anos após ser construído, Complexo é apontado como o responsável pelo aumento do ataque de tubarões no litoral pernambucano

por Mauro Pasini / Especial

Locomotiva da economia do nordeste e maior polo de investimentos do Brasil, o porto de Suape segue no meio de uma polêmica que perdura mais de três décadas – e ainda longe de uma conclusão. Estaria a implantação do Complexo Portuário – na divisa entre as cidades de Ipojuca e Cabo de Santo Agostinho – relacionada com o aumento no ataque de tubarões no litoral pernambucano? As teorias são muitas, mas indicam uma relação entre o projeto e os ataques do temido animal marinho. O Complexo Industrial Portuário Governador Eraldo Gueiros fica em uma área de 13,5 mil hectares, em um paraíso natural cercado de águas cristalinas, coqueiros e regiões de mangue. A construção do porto, a partir de 1978, foi executada em um período de frouxidão nas leis ambientais. Os críticos dizem que a terraplenagem interrompeu o fluxo de rios. Além disso, uma brecha de 300 metros foi aberta nos arrecifes para permiti r o acesso das embarcações. O impacto foi agravado com as alterações na salinidade da água e a destruição de ecossistemas considerados berçários naturais, forçando os tubarões a se deslocarem ao norte, em direção ao estuário do Rio Jaboatão e às praias metropolitanas do Recife.

Porto é responsável, mas não o único, dizem pesquisadores

Fábio Hazin

O perigo é quantificado pelo Comitê Estadual de Monitoramento de Incidentes com Tubarões (Cemit), criado em 2004 pelo governo pernambucano. Desde 1992, 59 ataques de tubarões foram registrados – 24 deles fatais. As principais vítimas tem entre 14 e 25 anos (78,8%). A mais recente foi a jovem paulista Bruna Silva Gobb, 22 anos, atacada na praia de Boa Viagem no dia 22 de de julho. Engenheiro de pesca, doutor em Oceanografia e professor da Universidade Federal Rural de Pernambuco (UFRPE), Fábio Hazin foi presidente do Cemit entre 2004 e 2012.

Em suas palestras, reconhece que não há uma única causa para os ataques e cita a degradação dos ecossistemas costeiros, o aumento no número de surfistas e banhistas, a topografia submarina da região, saneamento básico precário e alterações climáticas. “Suape é sim um dos fatores, mas não o único”, diz. Para a pesquisadora Rosangela Lessa, atual presidente do Cemit e também professora da UFRPE, não há dúvida da relação entre os ataques e as interferências humanas. “Todo desenvolvimento tem um custo”, diz.

O Centro utiliza anzóis posicionados em alto mar. Quando capturados, os tubarões são levados em uma embarcação para serem soltos. O projeto foi retomado em julho – coincidentemente após o último ataque – depois de sete meses parado por falta de recursos. No polêmico assunto, várias alternativas foram sugeridas para afugentar os tubarões das praias, como a instalação de telas, malhas e redes no fundo do mar. A ideia é da ONG Instituto Praia Segura que segue o exemplo de praias de Hong Kong, na China, mas esbarra na burocracia. No fim de julho, governo pernambucano anunciou a instalação de uma rede provisória e a colocação de mais placas de advertência – ações sugeridas pelo Ministério Público. Desde 2004, os esportes náuticos estão proibidos no trecho. Qualquer proposta que sugira exterminar a espécie – como defendem grupos de surfistas de Recife – revolta os pesquisadores.“Não queremos piorar ainda mais um problema ambiental que já é complexo”, diz Rosangela.

Em julho do ano passado o vereador de Recife, Raul Jungmann, ingressou com um pedido para que o Ministério Público elaborasse um inquérito civil responsabilizando o porto de Suape pelos danos ambientais. Responsável pelo inquérito da morte da jovem atacada em julho do mesmo ano, o promotor Ricardo Coelho afirmou que o Complexo Portuário e, possivelmente, a Petrobras devem ser responsabilizados em uma ação civil pública. “Todos os pesquisadores ouvidos sinalizam para a responsabilidade de Suape”, afirma.

 

Para Suape  acusações são especulativas, sem fundamento

Placa alerta para o operigo de banho na praia de Boa Viagem

Segundo a assessoria do porto, não há estudos que caracterizem um elo entre o início dos ataques e a criação de Suape. “Pelo contrário: a maior parte das ocorrências foi registrada no período de 1986 até 1999, época em que houve poucas intervenções no porto com supressão mínima nas áreas de mangue em Suape”, afirma, em nota, Pâmella Cavalcanti , assessora do Complexo.

Outra evidência apontada é o fato de que na década de 1990 – período de maior incidência de ataques, Suape operava com um menor volume de navios, comparando com a atualidade, e sempre apresentou regularidade na distribuição mensal de movimentação de embarcações ao longo dos anos, até os dias de hoje. Já as estatí sti cas do Cemit comprovam que os ataques de tubarão ocorrem principalmente em julho, devido às águas turvas, conjugadas com períodode lua cheia e maré alta, “nada podendo ser relacionado com o funcionamento do porto”, diz. “As suposições que vinculam Suape aos ataques de tubarão são meramente especulativas, sem qualquer fundamento técnico ou científico de que se tenha conhecimento”, ressalta.A antiga polêmica apenas começou.

 

 

                                                  Em 21 anos, 24 mortes foram registradas 

1992 – 03 (2 mortes)

1993 – 03 (1 morte)

1994 – 10 (2 mortes)

1995 – 03 (1 morte)

1996 – 03 (1 morte)

1997 – 03 (1 morte)

1998 – 04 (2 mortes)

1999 – 02

2000 – nenhum

2001 – 01 (1 morte)

2002 – 06 (3 mortes)

2003 – 01

2004 – 07 (3 mortes)

2005 – nenhum

2006 – 04 (2 mortes)

2007 – nenhum

2008 – 02

2009 – 01 (1 morte)

2010 – nenhum

2011 – 02

2012 – 02 (2 mortes)

2013 – 02 (2 mortes)