Impostos e falta de infraestrutura travam comércio de carros elétricos

0
640
IMPRIMIR
Leaf custa US$ 21,3 mil nos EUA. No Brasil sairia por R$ 230 mil / Divulgação/Nissan
Impulsionados por um Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI) mais favorável (que chegou a ser zero para carros 1.0), nos últimos anos consumidores correram às concessionárias em busca do carro próprio. A frota chegou aos 85 milhões de unidades, uma média de um veículo para cada 2,5 habitantes. Os dados são da Associação Nacional dos Fabricantes de Veículos Automotores (Anfavea) e do Instituo Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). O reflexo aparece no agravamento das emissões de poluentes e no ruído, além dos congestionamentos.

Enquanto isso, os elétricos são sobretaxados em 25% de IPI. Isto sem contar Imposto de Importação, PIS/COFINS, ICMS, taxas municipais e alfandegárias e IPVA. Para completar, não há políticas ou ações governamentais voltadas para esta área.

  Avanços tímidos

Alguns estados deram um passo a frente e zeraram ou reduziram o IPVA cobrado sobre veículos elétricos. No primeiro grupo estão Rio Grande do Sul, Maranhão, Piauí, Ceará, Rio Grande do Norte, Pernambuco e Sergipe. No segundo estão São Paulo, Mato Grosso do Sul e Rio de Janeiro. Apesar disso, esses veículos ainda são inacessíveis para a grande maioria da população. Com isso, as grandes montadoras ainda não apostam no mercado brasileiro.

A Nissan, por exemplo, comercializa o Leaf, um carro totalmente elétrico, por US$ 21,3 mil nos Estados Unidos (quase R$ 50 mil), preço que vem caindo em razão de incentivos governamentais. No mundo todo, cem mil unidades já foram vendidas. No Brasil, o modelo ainda é usado em fase de experimentação e não está disponível para os consumidores, mas estima-se que o valor para venda poderia chegar a R$ 210 mil.

A Toyota é a única montadora que lançou no Brasil um modelo com tração elétrica, o Prius. O veículo é híbrido, por isso é movido a partir de gasolina e de uma bateria que é recarregada a partir da energia gerada na aceleração e frenagem, sem necessidade de utilizar a rede elétrica. Mas o preço ainda está bem longe do alcance da maior parte dos brasileiros: R$ 120 mil.

Para se ter uma ideia da eficiência destes modelos, a estimativa é que a bateria do Leaf mantenha o mínimo de 90% da capacidade com até três mil ciclos de recarga, com vida útil de dez anos ou 160 mil quilômetros. A autonomia é de até 190 km com a bateria plenamente carregada. Já o Prius, por ser híbrido, pode percorrer até 25,5 km com um litro de gasolina, o que reduz o consumo de combustível pela metade na comparação com os carros comuns. Em média, os brasileiros rodam 54 km por dia.

Conforme Douglas Wittmann, pesquisador do Instituto de Energia e Ambiente (IEE) da Universidade de São Paulo (USP), o Brasil precisa aprender, com as experiências de outras nações, como desenvolver este mercado: “O cenário internacional disponibiliza um laboratório aberto e gratuito. Ainda que diferentes fontes divirjam nos indicativos, estima-se que a atual presença de VEs já tenha ultrapassado, globalmente, quatro milhões de unidades, sendo 90% híbridos”.

Ausência de políticas inviabiliza preços mais acessíveis


A indústria automobilística no Brasil tem planos de iniciar a importação de VEs ainda neste ano. Mas depende da definição de políticas específicas por parte do governo federal, o que ainda não aconteceu. Segundo o Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio (MDIC), o assunto vem sendo debatido junto aos empresários. Porém, nada está decidido.

imgChamadaMateria.jpgA Anfavea apresentou uma proposta para a pasta a fim de viabilizar a introdução de novas tecnologias de propulsão para automóveis e comerciais leves. A ideia é que isso ocorra em duas etapas, conforme o presidente da entidade, Luiz Moan Yabiku Junior: “Como o mercado é extremamente pequeno ainda, nossa proposta envolve, inicialmente, importação dos veículos. Depois, que as empresas possam fazer a montagem no Brasil, com o desenvolvimento de engenharia, fornecedores localização progressiva de componentes”. A importação ocorreria até 2017. Somente aí seria viabilizada a produção nacional. Para o setor, hoje a carga tributária impõe uma das principais dificuldades. O presidente da Anfavea explica, ainda, que o objetivo das empresas é investir em tecnologia para o desenvolvimento de veículos híbridos movidos a etanol, para que o Programa Nacional do Álcool (Pró-Álcool) seja mantido.

No Congresso Nacional, um projeto de lei que tramita desde 2011 estabelece incentivos à fabricação e utilização de automóveis elétricos no Brasil. Conforme o PL 2092, a compra de carros para o poder público deveria priorizar esses modelos para que, em até 10 anos, 20% da frota atual fosse substituída. Além disso, sugere a isenção de IPI e PIS/COFINS na importação e venda. A proposta passou pelas comissões de Minas e Energia, de Desenvolvimento Econômico, Indústria e Comércio e está na Comissão de Finanças e Tributação da Câmara dos Deputados desde abril de 2013.

Infraestrutura precisa de investimentos
Outro empecilho é a falta de infraestrutura: um maior número de veículos elétricos em circulação exigira a implantação de postos de recarga. E os números ainda são tímidos: o Brasil tem apenas 50 carregadores, sendo 44 de recarga lenta e seis de recarga rápida, segundo dados da Associação Brasileira de Veículos Elétricos. O Japão, por exemplo, tem 4,7 mil postos.

Para Wittmann, o principal entrave para o comércio de VEs no Brasil é político. Ele defende que são três aspectos que convergem contra os elétricos. “A primeira”, explica o pesquisador, “é a bandeira de que a tecnologia flex-fuel represente a grande contribuição do país em prol das energias renováveis. A segunda é a de que o pré-sal represente a salvação frente às energias fósseis. E a terceira é a manutenção do atraso tecnológico em que se encontra o sistema elétrico brasileiro”. Wittmann cita recentes apagões que ocorreram em diferentes regiões do país e que foram atribuídos, pelo governo, a problemas como curto-circuito e falhas operacionais. Além disso, acredita que não será possível a produção nacional a curto prazo, devido à falta de incentivo e à cultura de produção de carros populares. Por isso avalia que o primeiro passo será a importação.

Já o engenheiro de Itaipu Binacional Celso Novais, coordenador de um projeto para desenvolvimento de carros elétricos, diz que o sistema suportaria esses automóveis. “O consumo para uma recarga é o equivalente ao necessário para manter um ar condicionado ligado. Se todos os carros do Brasil fossem elétricos a partir de agora, haveria um aumento de 3% no consumo de energia”. Mas reconhece que a construção de eletropostos é um desafio e reafirma a prioridade na definição de políticas públicas. “A força do estado é importante para desenvolver tecnologias nacionais e gerar esta demanda. Acreditamos que o Brasil pode entrar, sim, no setor automotivo neste segmento, e este é o momento de iniciar a transição. Será muita vantagem pelo lado ambiental e econômico”, complementa.

(Artes: Paulo Soares)

materiaInterna Arte 2 - 670 x 470 T2.jpg