Mudanças Climáticas

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Thomas L. Friedman , é colunista do jornal The New York Times  e escreveu nesta semana um artigo muito interessante sobre as mudanças climáticas ( O mercado e a mãe natureza ). Abaixo, na íntegra o artigo:

 

Sempre que ouço a palavra “abismo”, lembro-me de uma coisa que John Holdren, o consultor de ciência do presidente Barack Obama, costumava dizer sobre como precisamos responder à mudança climática pois ninguém pode prever quando ela dar uma rápida guinada em seu curso. “Estamos guiando para um abismo em meio à neblina”, disse Holdren sobre o clima, e esse é um bom momento “para começar a pisar no freio”.

 

Aliás, quando se pensa na quantidade de dívida financeira que acumulamos no mercado e em quanto carbono colocamos na atmosfera, a coisa mais sábia que poderíamos fazer hoje, como país, é começar a pisar no freio. Deveríamos tanto emitir menos carbono para inverter a curva de emissões quanto acumular menos dívida para mudar o sentido de nossa curva da relação dívida/PIB. Infelizmente, não estamos fazendo nada disso.

A verdade é que estamos provocando as duas forças mais poderosas e implacáveis do planeta, o mercado e a mãe natureza, ao mesmo tempo. Estamos dizendo a ambas: “Ei, o que foi que vocês ganharam? Nenhum aumento das taxas de juros? Um aumento pífio da temperatura?” Eu só espero que possamos agir juntos antes que o mercado e a mãe natureza nos mostrem o que ganharam.

Considerem os enormes déficits de carbono e financeiros que estamos acumulando. Durante milhares de anos até a aurora da era industrial, há 200 anos, a atmosfera da Terra conteve 280 partes por milhão (ppm) de dióxido de carbono, o principal gás responsável pelo efeito estufa. Hoje, esse número está perto de 400 ppm, sendo que 450 ppm é rotineiramente citado como o ponto crítico no qual criamos as condições para uma aceleração descontrolada.

O derretimento do permifrost (o subsolo congelado) no Alasca, Canadá e Sibéria, por exemplo, liberaria quantidades imensas de carbono, que aumentariam ainda mais o aquecimento global. O permifrost está repleto de dióxido de carbono e metano congelado, que é 25 vezes mais potente que o CO2 como gás do efeito estufa. “Se a tundra continuar derretendo”, diz Hal Harvey, o diretor executivo da Energy Innovation, “poderíamos basicamente liberar o equivalente a todo carbono que toda a humanidade emitiu desde o começo da história até agora”. Isso realmente jogaria as temperaturas nas alturas, derretendo o gelo e elevando os níveis dos mares.

Estamos numa trajetória semelhante com a nossa dívida. Os déficits crescentes impeliram a relação entre a dívida e o PIB dos EUA de 36,2% em 2007 para 72,8% hoje. Em seu muito aclamado livro sobre crises de crédito, This Time Is Different (Desta vez é diferente, em tradução livre) os economistas Carmen Reinhart e Kenneth Rogoff argumentam que países que permitem que suas relações dívida/PIB excedam 90% experimentam um crescimento mais lento e maior instabilidade – parecido com atingir um ponto crítico climático. Aliás, eles notam, os que apontariam as baixas taxas de juros de hoje como uma espécie de “carta branca” para mais endividamento “devem se lembrar que as taxas de juro do mercado podem mudar como as condições do tempo”.

Há outro paralelo notável. Em algum ponto, se permitirmos que todo esse carbono se acumule na atmosfera, nossos mais intensos esforços para reduzir as emissões com eficiência energética, conservação e novas tecnologias só nos permitirão ficar no mesmo pé em que estamos. Eles não conseguirão mais inverter a curva. E 450 ppm não é um lugar onde querermos ficar.

Em algum ponto, a dívida ficará tão grande que grandes aumentos de impostos e cortes de gastos simplesmente servirão para pagar juros. Tampouco seremos capazes de inverter esta curva, e os gastos com infraestrutura, educação e os pobres desaparecerão.

Opostos. Fico chocado pela maneira como muitos liberais insistem na redução imediata das emissões de carbono, mas, sobre o déficit, dizem que não há nenhuma urgência, pois não há aumentos das taxas de juros à vista. E fico chocado pela maneira como muitos conservadores insistem que os EUA precisam reduzir de imediato o déficit, mas, sobre o clima, dizem que não há nenhuma urgência, pois, por enquanto, o aumento de temperatura tem sido leve. Uma razão pela qual as taxas de juros estão tão baixas é que elas estão sendo contidas pelo afrouxamento quantitativo do Federal Reserve (Fed, o banco central dos EUA). Isso não vai durar. Quanto ao clima, bem “a mãe natureza não faz afrouxamento quantitativo”, disse Harvey. Fiquem atentos aos movimentos não lineares em ambos.

Não podemos dispensar o carvão do dia para a noite e não podemos entrar numa recessão ao cortar gastos do dia para a noite. Mas precisamos começar a pisar no freio em ambos os casos, fazendo acordos sobre cortes de gastos, aumento de impostos e novos investimentos que seriam introduzidos gradualmente, à medida que a economia melhorar, além de padrões de eficiência mais altos para usinas elétricas, prédios, veículos e aparelhos domésticos que também poderiam ser implementados aos poucos.

Um imposto sobre o carbono reforçaria e tornaria mais fácil as duas estratégias. Segundo um estudo de setembro do Serviço de Pesquisas do Congresso, um pequeno imposto sobre o carbono de US$ 20 por tonelada – aumentado 5,6% anualmente – poderia reduzir o déficit projetado para 10 anos em aproximadamente 50% (de US$ 2,3 trilhões para US$ 1,1 trilhão).

O que você realmente faria para resolvermos problema fiscal: desistir da dedução da hipoteca de sua casa, e esperar mais dois anos pela Seguridade Social e o Medicare, ou pagar um pequeno extra por gasolina e eletricidade? Estas serão nossas escolhas. Eu preferiria pagar o pequeno imposto sobre o carbono, em especial porque isto limparia o ar para nossos filhos, promoveria a inovação e nos tornaria menos dependentes da região mais instável do mundo, o Oriente Médio.

Como é possível que não esteja hoje em discussão um imposto sobre o carbono? / TRADUÇÃO DE CELSO PACIORNIK