Sob sanções, Irã armazena petróleo no mar

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Navio petroleiro iraniano Neptune, ancorado no estreito de Hormuz/Samy Adghirni/Folhapress

Por SAMY ADGHIRNI
ENVIADO ESPECIAL AO ESTREITO DE HORMUZ- Folha de São Paulo

Dezenas de petroleiros estão parados nas águas calmas e mornas do estreito de Hormuz, em frente à praia de Bandar Abbas, principal cidade no litoral sul do Irã.

Mar adentro, a 20 km da costa, encontram-se os navios maiores, motores desligados e âncoras estendidas.

A bordo de uma lancha de contrabandistas, a Folha e os jornais “New York Times” e “Washington Post” comprovaram que o tráfego de petroleiros iranianos está virtualmente paralisado por causa das últimas sanções internacionais contra Teerã.

  Samy Adghirni/Folhapress  
 
Navio petroleiro iraniano Neptune, ancorado no estreito de Hormuz

“Nunca vimos tantos navios parados por aqui”, diz Rostam, o contrabandista que pilota a veloz lancha sob um sol de chumbo. Quase todos flutuam com água batendo na parte de baixo do casco, sinal de que estão vazios, à espera de carregamento.

Mas o maior dos petroleiros, batizado de Neptune para despistar a origem iraniana, tem meio casco submerso, prova de que carrega no tanque dezenas de milhares de barris de óleo bruto.

O Neptune é um dos navios usados para estocar o petróleo que o Irã continua produzindo, mas não consegue vender devido às sanções.

Diogo Shiraiwa/Editoria de Arte/Folhapress
Onde fica do estreito de Hormuz
 

“Está parado há um mês. Perto do porto, estão estacionados mais dois petroleiros carregados”, diz Rostam.

Especialistas dizem que a maioria das 39 embarcações que compõem a frota da estatal iraniana de transporte de hidrocarbonetos é usada apenas como depósito.

Com a implementação progressiva do embargo europeu a partir de janeiro, o Irã hoje consegue exportar menos da metade dos 2,8 milhões de barris extraídos diariamente.

Até países asiáticos, os maiores clientes, cederam à pressão europeia e americana e limitaram as compras de óleo. O Irã reduziu a produção, mas não pode suspendê-la porque carece da tecnologia para fechar os poços sem condená-los em definitivo.

O resultado é um acúmulo de óleo bruto que já não cabe nas instalações terrestres, obrigando Teerã a recorrer à estocagem no mar. O prejuízo, avaliado em US$ 3 bilhões mensais, sufoca a principal fonte de renda do país.

O esvaziamento dos cofres públicos ameaça programas sociais e agrava o cenário de desemprego e inflação.

Um advogado da indústria petroleira iraniana disse à Folha que China e Índia continuarão comprando petróleo iraniano, mas em condições muito desfavoráveis a Teerã.

“O regime hoje se vê obrigado a assinar contratos para receber pagamento em moeda local ou até em bens de consumo de baixo valor.”

Segundo o advogado, a dificuldade de exportar petróleo soma-se a uma longa lista de problemas causados pelas sanções. “O Irã precisa desesperadamente de investimento e tecnologia, mas ninguém quer vender. O país estar banido do sistema financeiro dificulta negócios inclusive fora da área petroleira.”

TENSÃO MILITAR

Hormuz não é só o principal canal da produção iraniana. O apertado corredor marítimo é ponto de passagem do petróleo extraído em vários países do golfo Pérsico. Um quinto da produção mundial passa pelo estreito, que o Irã ameaça fechar com minas em represália à pressão.

Para evitar esse cenário, os EUA reforçaram sua presença naval no golfo Pérsico. “Os navios americanos estão logo ali na frente”, aponta o contrabandista Rostam.