Portos secos e molhados disputam armazenagem de contêineres

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A tarifa polêmica, conhecida como THC-2, tá ligada ao chamado serviço de Segregação e Entrega (SSE), que é basicamente a movimentação de cargas dentro do pátio do porto.

Há pelo menos quatro anos os terminais retroportuários, chamados de portos secos, e os portos“molhados” da APM Terminals e Portonave, que atuam no complexo portuário de Itajaí, travam uma batalha nas esferas jurídicas e governamentais. O motivo é uma tarifa imposta pelos dois portos, considerada alta demais, para que as empresas que atuam na atividade retroportuária possam retirar os contêineres do pátio dos portos.

O sindicato das Empresas Operadoras de Terminais Retro-Portuários de Itajaí e Região (Sinter) argumenta que há um duopólio dos operadores portuários de Itajaí e Navegantes. Daí, por dominarem o mercado local, Portonave e APM Terminals teriam criado a cobrança chamada THC-2 e exagerado no preço da tarifa.

As administrações dos dois portos negam as acusações e garantem que a cobrança é legítima, já que é baseada num serviço que de fato é prestado.

Competividade

Os representantes dos terminais retroportuários argumentam que a cobrança deixa a atividade menos competitiva em Itajaí, em relação a outras regiões portuárias do estado e do país.

A cobrança em Itajaí seria até oito vezes maior que em Santos, por exemplo. “O problema todo é o quanto cobrar. Até porque os terminais retro [portos secos] concorrem com os terminais molhados [áreas de armazenamento de carga alfandegada que ficam dentro do porto]. Os terminais molhados fazem investimentos muito maiores que os outros terminais, então é justo que cobrem, mas faltam critérios objetivos para calcular isso”, pondera Osvaldo Agripino de Castro, advogado do escritório Agripino & Ferreira, que representa o Sinter.

Entenda o que é o THC-2

O THC já é uma taxa convencional, cobrada em geral nos contratos de importação e exportação. Ela se refere aos serviços de transporte dos contêineres do navio até o pátio do porto, no caso das importações, ou do pátio até navio, no caso das exportações.

O que a Portonave e a APM Terminals teriam criado é o THC-2, que é a taxa pelos mesmos serviços mas que é cobrada quando a carga importada sai do pátio do porto e vai para algum terminal retroportuário, ou seja, para algum porto seco concorrente.

Os portos secos são concorrentes da APM e da Portonave e têm, em geral, taxas mais baratas de armazenagem de cargas de clientes que desembaraçam essa importação de forma mais lenta. Com a invenção da cobrança do THC-2, esse custo da taxa acaba refletindo no custo final da importação.

E é aí que entra a reclamação do sindicato dos Terminais em relação aos dois portos do complexo de Itajaí. “Entendemos que aqui há um duopólio da APM, sócia da Maersk, e da Portonave, sócia da MSC. Esses gigantes (Maersk e MSC) fazem parceria para decidir rotas. Eles têm uma política de colocar a cobrança lá em cima para que o usuário não possa retirar diretamente seu contêiner onde deseja”, acusa Osvaldo Agripino, o advogado do Sinter.

Pela tabela de preços da APM, a taxa de segregação é de R$ 1056,00 por contêiner operado. Já na Portonave, a segregação pode custar entre cerca de R$ 1,5 mil e mais de R$ 2 mil (aí incluídos todos os serviços de armazenagem, levante de contêiner e pesagem). “Em Santos, esse valor ficaria entre R$ 170 e R$ 220”, disse ontem ao DIARINHO o diretor de um porto seco.

Sobram ações na justiça e recursos administrativos apresentados pelos representantes dos terminais retroportuários a órgãos federais. Também há algumas decisões judiciais referentes ao caso.

Em julho do ano passado, por exemplo, o Tribunal de Contas da União (TCU) se manifestou sobre o tema e aplicou uma multa em diretores da Antaq. O motivo: falta de uma regulação adequada na cobrança do serviço de Segregação e Entrega.

O TCU entendeu que a cobrança sem regulamentação adequada é indevida. Por isso, os ministros do tribunal determinaram que o órgão regulador publicasse normas para custos e serviços prestados pelos terminais e ainda elaborasse a “revisão da regulamentação concernente à cobrança do serviço de segregação e entrega de contêiner (SSE ou THC)”.

Somente em agosto deste ano é que a Antaq publicou a norma número 34, que regulamenta a prestação de serviços de movimentação de cargas nos pátios de terminais portuários, incluindo o serviço de segregação de cargas e a taxa de movimentação no terminal (THC).

Na norma, que é genérica, há a proibição de preços muito acima do mercado. “São vedadas as práticas de preços abusivos ou lesivos à concorrência”, diz a regra. O prazo para portos se adequarem é de 180 dias, a serem contados a partir do dia 21 de agosto.

O problema é que até lá a situação continua a mesma. Segundo o Sinter, isso onera as empresas de ‘portos secos’, encarecendo o serviço e tornando a atividade menos competitiva em Santa Catarina.

Liminares

A empresa de armazenamento alfandegado Localfrio, de Itajaí, chegou a conseguir liminarmente duas decisões contra a APM e a Portonave para não pagar a taxa de THC-2 ou então depositar em juízo até decisão definitiva do processo. As duas ações estão em fase de recurso, em segunda instância.

Na Justiça Federal uma ação civil pública chegou a ser apresentada pelo ministério Público Federal (MPF) e pelo Sinter contra os dois portos, em agosto de 2018, sob o argumento de “cobrança abusiva, discriminatória e ilegal de tarifa portuária”.

Em sentença assinada no dia 9 de julho deste ano, o juiz Jurandi Borges Pinheiro, da 2ª Vara Federal de Itajaí, extinguiu a ação e recomendou que o Sinter primeiro trate do assunto na esfera administrativa, através do conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade).

E é no Cade que estão pelo menos seis processos sobre o assunto. O órgão é responsável pelo fiscalização e combate de concorrência desleal em setores da economia.

Em casos anteriores e parecidos com o que acontecem no complexo portuário de Itajaí, operadores portuários de Santos (SP), Rio Grande (RS) e Salvador (BA) já foram multados em mais de R$ 15 milhões, somando todas as multas, por entenderem que houve “uma condição monopolista” no mercado de armazenagem alfandegada.

Há processos no Cade contra a APM Terminals, de Itajaí, e a Portonave, de Navegantes, mas nenhum com decisão definitiva.

Fonte: O Diarinho