O setor de transportes é um dos termômetros da crise do coronavírus na Serra Gaúcha

0
368
IMPRIMIR
No mês de abril, na Estação Aduaneira Porto Seco, registrou-se queda na faixa de 45% a 50% na demanda. Foto: Diogo Sallaberry / Agencia RBS

Muito antes da pandemia do coronavírus, ou da greve dos caminhoneiros, ou de todas as crises econômicas e políticas que a Serra Gaúcha também tem enfrentado nas ultimas décadas, já se dizia que Caxias do Sul precisava solucionar os problemas de mobilidade e de transportes. Essa crise sanitária pela qual o mundo todo passa atualmente só coloca uma lupa gigante no entrave de logística. 

Não por acaso, o grupo Mobilização por Caxias (MobiCaxias) tem insistido nas pautas de infraestrutura, como as construções do Aeroporto da Serra Gaúcha e de, pelo menos um, terminal portuário no Litoral Norte, além das obras de duplicação das rodovias RS-122 — de Farroupilha a São Vendelino — e da RSC-453 e RS-486 (Rodovia Euclides Triches), além da ampliação da BR-448 (Rodovia do Parque), até a RS-240 no município de Portão, Vale dos Sinos (essa extensão teria o nome de Rodovia da Serra). Está na lista de reivindicações ainda a implementação do modal ferroviário de transporte de passageiros e de carga na Serra Gaúcha.

Enquanto esse mundo ideal não se faz presente, as empresas de logística da região precisam se virar como podem para transportar produtos e insumos, apesar das restrições por conta das medidas de prevenção à covid-19 e da falta de infraestrutura de mobilidade. Um dos termômetros, e que também revela como anda o setor industrial, sobretudo na Serra Gaúcha, é a Estação Aduaneira Porto Seco, que fica em Caxias. É no Porto Seco onde ocorrem os despachos de importação e exportação que abastecem as empresas na Serra.

Mauro Vencato é o supervisor comercial do Porto Seco e revela que, desde o final de março, percebeu uma “queda violenta” na demanda, seja de entrada ou saída de cargas. Para ele, há dois fatores que evidenciam esse menor movimento. Primeiro, a paralisação da China ainda no início deste ano, e depois, de outros países da Europa e dos Estados Unidos, de onde vêm muitos produtos, máquinas e insumos para a Serra. Segundo, a instabilidade do dólar faz com que muitas empresas esperem a cotação baixar para retirar suas encomendas do Porto Seco, consumando a importação.

 — O mês de abril terminou bem fraco, tivemos uma queda na faixa de 45% a 50%. Diferenciamos processos de volume financeiro, porque só se consuma um processo de importação, por exemplo, quando a empresa paga os impostos e retira o produto do Porto Seco. Então, em termos de processo, numa comparação de abril de 2019, com abril de 2020, se manteve praticamente o mesmo. Mas o volume financeiro reduziu em 17% em abril deste ano. Na mesma comparação, tivemos uma queda de 43% em processos de saída de cargas — revela Vencato.

Menor produção, menos transportes

Esses dados refletem a realidade do mercado na região, sobretudo, na indústria, um dos polos produtivos mais significativos do Brasil. A pesquisa da Sondagem Industrial, divulgada em 23 de abril, pela Federação das Indústrias do Estado do Rio Grande do Sul (Fiergs) revela que 65,9% das empresas gaúchas do setor registraram queda na produção em março em função da crise provocada pelo coronavírus. 

Além disso, a mesma pesquisa aponta que oito em cada 10 empresas enfrentam dificuldades para conseguir insumos e matérias-primas. Dentre essas, a dificuldade é muito grande para 24,5%. Em função da crise, 78,5% enfrentam problemas com a logística de transporte de seus produtos, insumos e matérias-primas. A dificuldade é ainda maior para 28,2% das empresas que responderam à pesquisa.

Entre os principais impactos causados pela pandemia do coronavírus nas empresas, foram apontados no levantamento a redução do faturamento (72,3% das respostas), o cancelamento de pedidos e encomendas (56,6%) e a inadimplência de clientes (55,4%). Para atestar essas constatações, Vencato revela que, no mês de abril de 2020, houve redução de 34% no valor dos produtos importados em relação a 2019.

— Somos um termômetro um pouco atrasado. Digo isso porque os problemas que ocorreram na China, de não embarcar produtos, máquinas e matéria-prima, estamos refletindo agora. Porque a importação é um processo demorado, de até 180 dias — explica Vencato.

Reação gradual a partir de abril

A Plimor, com sede em Farroupilha, completa 45 anos em 2020. Atende São Paulo, Paraná, Santa Catarina e Rio Grande do Sul, além da Argentina. Desde a segunda quinzena de março, a empresa sentiu o impacto imediato na demanda do transporte de cargas. Nas entregas para a Argentina, por conta do fechamento das fronteiras imposto pelo governo, a empresa teve queda de 100% das entregas. Já no mercado interno, houve diminuição de até 40%, conforme o relato de Guilhierme Bortoncello, diretor comercial da Plimor. 

— O setor de transportes como um todo foi muito afetado, não só o rodoviário de cargas, mas também o aéreo e marítimo. Nós sentimos um impacto maior no final do mês de março, quando tudo parou. Foi um choque de realidade, porque a queda foi de 40%, em março na comparação da primeira com a segunda quinzena — explica Bortoncello.

No mês de abril, revela o diretor comercial da Plimor, a queda estabilizou e ocorreu até um aumento na demanda. Em relação à queda acentuada no final do mês de março, Bortoncello diz que houve um incremento de 15% da demanda. Mesmo assim, está 25% menor no comparativo com o período anterior à crise do coronavírus.

— Ao longo das semanas, principalmente a partir do dia 10 de abril em diante, por atendermos a uma infinidade de segmentos, conseguimos suprir um pouco da queda com o e-commerce. Mas obviamente, não voltou ainda como era antes — justifica.