“Não é possível explorar e conservar”

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Mariângela Guimarães

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Numa conferência internacional sobre Conflitos Socioambientais e Direitos Humanos realizada na semana passada na Universidade de Utrecht, na Holanda, os conflitos na bacia do rio Tapajós estavam entre os temas centrais. Um dos participantes do evento foi Gilson de Jesus Rego, da Comissão Pastoral da Terra. Nesta entrevista à Radio Nederland, ele fala sobre os principais problemas vividos pela população daquela região, uma das que mais sofre com a violência no campo no Brasil, e argumenta que o discurso do desenvolvimento sustentável é falacioso.

“Há um processo muito grave de violência na nossa região, por conta principalmente do avanço da soja para aquela área mais ao norte do estado do Pará. E isso com o apoio do Estado. O Pará é o estado com o maior número de conflitos, violência e assassinatos.”

Segundo Gilson, nada tem sido feito para evitar que a violência continue acontecendo. “O Estado brasileiro não faz nada para que isso pare. Pelo contrário, o Estado brasileiro é o principal contribuinte para que este processo de violência continue na região. É só observarmos o desregramento dos códigos florestais, as inovações nos códigos que estão ligadas à questão fundiária. O Estado brasileiro é um incentivador dos conflitos na região. É o povo que faz a resistência. E esta resistência é um tanto quanto frágil diante de tanto poder, tanto econômico como oficial. Mas há um processo de resistência latente, permanente, e que não se encerra mesmo com tanta violência.”

Mudança radical Sem medo de utopias, Gilson vê como única solução definitiva para os problemas na região a mudança significativa do sistema de produção. “Se a gente tivesse esta mudança radical no modo de produção, evidentemente a gente teria todas as atividades que estão pensadas para o capital internacional sendo paradas. Como nós não vamos conseguir fazer isso imediatamente, o que estamos tentando fazer junto com as comunidades é tentar garantir que os territórios ocupados pelas populações originárias sejam reconhecidos pelo Estado, o que não é fácil”, salienta o ativista.

“O Estado brasileiro não é um aliado nesta relação, mas as pressões feitas pelos movimentos sociais e pelas comunidades têm obrigado o Estado a reconhecer alguns territórios, principalmente a partir de mecanismos como a Reforma Agrária. Alguns territórios foram garantidos, houve a criação de algumas unidades de conservação, alguns territórios quilombolas – muito poucos -, e terras indígenas – também muito pouco. Mas a cada momento que a gente avança um pouquinho, o Estado brasileiro volta e refaz regras para impedir que estes grupos tenham acesso a estas terras.”

Hipocrisia Além de não acreditar no Estado Brasileiro, Gilson também não acredita que os governos internacionais possam ajudar de alguma forma e condena o discurso do desenvolvimento sustentável, que segundo ele, não é viável.

“Os governos estão a serviços do grande capital. É uma hipocrisia enorme falar em desenvolvimento sustentável. A sustentabilidade é um discurso falacioso para tentar convencer a sociedade de que é possível atividade de exploração com conservação. E não é possível explorar e conservar. O discurso da sustentabilidade é falacioso.”