Manual pode transformar pessoas saudáveis em pacientes

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Por Johan van der Tol

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O número de diagnósticos de transtornos psiquiátricos, como o Transtorno do Déficit de Atenção com Hiperatividade (TDAH) aumentou de maneira explosiva nos últimos anos. Segundo especialistas holandeses, crianças mais ativas ou com baixa capacidade de concentração são erroneamente rotuladas como pacientes, o que é bom apenas para o caixa dos fabricantes de medicamentos. Eles temem que com o novo manual de psiquiatria, que é utilizado mundialmente, mais pessoas saudáveis serão desnecessariamente consideradas doentes.

O professor Roel Verheul, autoridade reconhecida internacionalmente na área de transtornos de personalidade, ficou orgulhoso quando foi convidado, em 2008, para colaborar na quinta edição do ‘Diagnostic and Statistical Manual of Mental Disorders’ (Manual Estatístico e Diagnóstico de Transtornos Mentais), também conhecido como DSM. Mas em abril, ele e seu colega canadense, John Livesley, deixaram o grupo de trabalho sobre transtornos de personalidade, depois de, em vão, terem feito repetidas críticas ao conteúdo da bíblia norte-americana da psiquiatria.

Complicado A principal queixa de Verheul é que os textos no DSM-5 são muito complicados, em lugar de simplificarem os diagnósticos. E com isso existe o perigo de que psiquiatras passem a manipular indicações próprias – algo que o manual justamente tenta prevenir. “Tememos que vire um trabalho de ‘adivinhação’, no qual diferentes psiquiatras chegam a diferentes diagnósticos para o mesmo paciente”, disse Verheul a um programa da televisão holandesa.

Além disso, o manual também contém inúmeras novas indicações que, segundo Verheul, são cientificamente infundadas. Teriam que ser primeiro fundamentadas por pesquisas empíricas. Enorme crescimento Outros também alertam para o enorme crescimento de novos transtornos psiquiátricos. Com isso, pessoas que agora têm um pequeno problema, serão rotuladas como pacientes. “O número de diagnósticos psiquiátricos e o uso de medicamentos aumentaram imensamente nos últimos anos”, segundo a psicóloga Laura Batstra, da Universidade de Groningen. “Com o DSM-3, aumentou principalmente o número de diagnósticos entre adultos, e com o DSM-4 entre crianças”, diz Batstra, referindo-se às últimas versões do manual, em 1987 e 2000.

Após o ano 2000, os transtornos do déficit de atenção com ou sem hiperatividade entre crianças aumentaram exponencialmente. Bem como o uso do medicamento contra eles, Ritalin. Segundo Batstra, a grande maioria destas crianças não tem nenhum problema médico e não deveria estar tomando remédios.

Implausível “É preciso ter cuidado para não haver inflação no diagnóstico”, diz Verheul. “É fácil se pensarmos, por exemplo, que 1% do total da população é elegível para o diagnóstico de esquizofrenia, ou que talvez 2, 3 ou 4% das crianças podem ter um diagnóstico de TDAH. Ampliando os critérios, de forma que um grande número de pessoas receba estes rótulos, surge uma espécie de inflação da psiquiatria. E com isso a psiquiatria pode se tornar implausível aos olhos de muitos.”

Indústria farmacêutica Os fabricantes de Ritalin têm, segundo Batstra, um papel discutível no diagnóstico de ADHD. “Está realmente fora de controle. A indústria farmacêutica entrou com tudo para promover o distúrbio entre as meninas. No DSM-5 as categorias são definidas ainda mais amplamente, então acho bom que esteja surgindo esta discussão agora.”

Uma pesquisa feita nos EUA demonstrou que 72% dos especialistas que colaboram com o DSM têm laços financeiros com a indústria farmacêutica. Estes laços variam desde pagamento para uma palestra num congresso até a posse de ações. Batstra diz que isso é preocupante. “Sabemos, por exemplo, que pesquisas pagas pela indústria farmacêutica têm resultados cinco vezes melhor para o uso de medicamentos do que pesquisas independentes.”

O DSM-5 deve ser lançado em maio do ano que vem.