Fim da “Guerra dos Portos” incentiva terminais a investir em logística

0
640
IMPRIMIR
Meton Soares, presidente da Fenavega
Conhecida como “guerra dos portos”, a disputa fiscal entre os terminais portuários brasileiros está com os dias contados. A partir de janeiro de 2013, com a entrada em vigor do Projeto de Resolução nº 72 do Senado Federal, todos os estados do país cobrarão a alíquota única de 4% para o Imposto de Circulação de Mercadorias e Prestação de Serviços (ICMS) sobre produtos importados.
Para o presidente da Federação Nacional das Empresas de Navegação Marítima, Fluvial, Lacustre e de Tráfego Portuário (Fenavega) e vice-presidente da seção de Transporte Aquaviário, Ferroviário e Aéreo da Confederação Nacional do Transporte (CNT), Meton Soares, o fim dos benefícios fiscais deve estimular a concorrência e obrigar administradores portuários a investirem em infraestrutura e logística.
Jacy Diello / Agência CNT de Notícias
 
A aprovação da Resolução que pôs fim à Guerra dos Portos e unificou a alíquota do ICMS foi uma atitude “justa”?
Atualmente, toda a importação que chega ao Porto de Vitória, por exemplo, recebe, se não me engano, uma alíquota na ordem de 7%, enquanto no Rio de Janeiro você paga 18%. Havia esse disparate, o que favorecia os importadores a privilegiarem determinados portos que ofereciam melhores condições [taxas de ICMS menores] para transportar sua carga com menores custos, obviamente. Agora houve esse nivelamento, o que colocou todos os Estados a 4%.
 
Em função disso, alguns portos estimam perdas de 30% com a unificação da alíquota.
 

Sim, porque a localização dos portos influenciará a decisão do importador. Essa decisão vai depender do destino final da carga, uma vez que ela chega ao porto e depois segue por rodovia ou ferrovia. É óbvio que quanto menor a distância do porto ao seu destino, menor será o frete pago. Para dar um exemplo: o transporte de um contêiner da China para o Brasil custa, em média, US$ 1,2 mil. Para levar essa mesma carga de Santos para São Paulo, o importador paga R$ 2 mil. Exceto por este aumento do dólar, o investimento era praticamente o mesmo. Você estava a 10 mil quilômetros de distância e o valor pago era quase o equivalente a transportá-la de Santos para São Paulo. Então, acaba mais conveniente ao importador trazer essa carga por um porto que tivesse um ICMS mais baixo.

Com a unificação do imposto, os importadores exigirão outros benefícios?

Quando você nivela o ICMS, faz com que o importador mude o pensamento e procure o porto que lhe ofereça melhores condições. Primeiro. Ele vai querer evitar fila. Em determinadas épocas do ano, alguns terminais têm fila para a atracação, em função de carga, descarga, safra.
Segundo, o custo da atracação. Existe uma série de fatores provenientes dessa operação. É atracação direta, custo de rebocadores, custo de lancha. Tem o problema da praticagem, o fato de o porto ter equipamento próprio ou não. Tem ainda a questão da disponibilidade do equipamento para receber a carga. Se essa carga vai entrar em armazenagem ou se ela vai ser despachada imediatamente. Você tem todo um sistema operacional e é aí que os portos vão ter que trabalhar. Quem oferecer a menor tarifa total, não apenas ICMS.
 
Vai vencer quem oferecer a melhor logística?
Sim, vai vencer quem tiver a melhor logística. Você tem que ter a saída do porto, a entrada, com as melhores condições. Esse é um ponto de estrangulamento portuário. Outro ponto de estrangulamento portuário é espaço para estacionamento de veículos, acesso ferroviário, rodoviário. Esses fatores vão influenciar substancialmente.
Os portos terão que investir mais para atrair os importadores?
Eu sempre disse que nós não temos no Brasil portos que possam competir com os maiores terminais internacionais. Nenhum porto no Brasil compete com Hamburgo [Alemanha], Antuérpia [Bélgica], Rotterdam [Holanda]. Nenhum deles. Por quê? Não temos a infraestrutura que lá fora eles possuem. Lá os portos têm acesso fácil à privatização, eles têm área de fundeio fantástica, quilômetros de atracação. Enquanto o Porto de Santos possui 12 km de atracação, Rotterdam tem 47 km. É difícil fazer uma comparação. Acredito que o ideal seria selecionarmos seis ou sete grandes portos e investir maciçamente em infraestrutura, para que permitam acesso rápido e eficiente. Fazer esses hup ports [porto concentrador] e fazer um sistema feeder eficiente [navios menores, que realizam o serviço de alimentação, mais conhecido como feeder service. Aqui, todo mundo quer construir porto, sem qualquer planejamento. Mas nem sempre o fazem nas condições necessárias.
 
Vitória já anunciou que fará investimentos em uma obra de dragagem.
Vários portos já anunciaram obras. É preciso que eles tenham infraestrutura para atender os grandes navios. O problema não é apenas o calado, mas os canais de atracação, o canal de acesso, largura e profundidade, para que um navio não impeça outro de navegar pelo mesmo canal. O porto precisa ter largura e profundidade. A bacia de evolução também deve ter profundidade e espaço de manobra suficiente. Tem ainda a questão da atracação. Você também tem que ter atracação eficiente, que atenda a esses grandes navios. Mas uma questão crucial é a área operacional, que possa receber uma quantidade expressiva de contêineres e cargas, sem tumulto. Onde possam atuar ferrovias, rodovias. Isso falta no Brasil.

Essa disputa entre os portos vai ser positiva, nesse sentido?

Durante décadas não houve investimentos em portos no Brasil. Os investimentos mais significativos foram feitos há dois anos, na gestão do Pedro Brito, em obras de dragagem. Mas há muito ainda a ser feito. Eu acho que isso pode despertar nos administradores a necessidade de evoluir não apenas com o favorecimento fiscal. Sendo favorecido por um sistema tarifário, por uma operação rápida e ágil. Com investimento em equipamentos, mão de obra.

Outro ponto fundamental é que precisamos desburocratizar. O Porto Sem Papel precisa evoluir cada vez mais e o sistema de despacho e de recebimento de navios precisa ser simplificado. Não dá para termos dez, doze ministérios envolvidos em uma operação de navio. Precisamos evoluir.