Estaleiro ” virtual” está coberto de mato

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POR SERGIO TORRES, ENVIADO ESPECIAL / ARACRUZ, SABRINA VALLE / RIO , TASSO MARCELO / FOTOS – O Estado de S.Paulo

Recém-contratado para construir seis sondas de perfuração da camada do pré-sal, o estaleiro Jurong Aracruz, no litoral do Espírito Santo, só existe em projeto. O terreno de 825 mil metros quadrados onde funcionará, passados 70 dias do lançamento da pedra fundamental, não teve nem a vegetação retirada ainda.

 

O serviço de terraplanagem não começou. Há poucas máquinas, caminhões e trabalhadores. O ritmo é muito lento. Para quem passa em frente, nada ali indica que no ano que vem o estaleiro planeja começar a construir a primeira sonda.

O Jurong Aracruz é um dos “estaleiros virtuais” (assim apelidados por serem construídos concomitantemente às embarcações que produzem) qualificados como “famosos” pela presidente da Petrobrás, Graça Foster, em entrevista ao Estado. A possibilidade de atrasos a incomoda e ela afirmou que vai cobrar dos estaleiros a entrega das sondas nas datas contratuais. Chegou a afirmar que atuará como uma “mosca de boi”, forma de dizer que ficará em cima dos estaleiros.

As seis sondas serão afretadas à Petrobrás. A demora na entrega de navios e sondas resulta em atrasos na entrada em produção de campos do pré-sal e, consequentemente, em prejuízos à estatal, já onerada pelos custos da defasagem entre os preços domésticos dos combustíveis e os cobrados no mercado internacional.

Vinculado ao Jurong, peso-pesado da indústria naval mundial, com cinco estaleiros em Cingapura, o Jurong Aracruz instalou-se em terreno na Barra do Sahy, praia da cidade de Aracruz, quase 100 km ao norte de Vitória.

Maquete do futuro estaleiro

 

O projeto ambicioso prevê o emprego de até 6 m il trabalhadores diretos e indiretos na fase de operação, com encomendas suficientes para 30 anos de construção ininterrupta de navios, sondas, plataformas e embarcações variadas para, especialmente, o setor de óleo e gás, superaquecido pelas riquezas do pré-sal.

A movimentação no terreno retangular, entretanto, não traduz a urgência e a pujança do empreendimento. Às 11h de quinta-feira, avistava-se da Rodovia ES-010, que acompanha aquele trecho do litoral capixaba, todo o espaço onde o porto se instalará, exceto o limite com o oceano, encoberto por árvores que chegam à altura de 20 metros. Havia no campo de visão três caminhões (dois parados), um trator e uma escavadeira.Uma caminhada pela linha de arrebentação da praia deserta de 2 km de extensão, a ser destruída pela obra, revela que os serviços ainda não chegaram ali. A paisagem da praia de areia escura, água em tom verde-escuro e pedras de variados tamanhos deve ser a mesma de quando da chegada dos portugueses ao Brasil, em 1500. Não há sinal de obra.

Mão de obra

O estaleiro não quis comentar o andamento dos trabalhos, sob o argumento de que o desmatamento nem terminou e a principal executiva, Luciana Sandri, está fora do Brasil. Outro entrave que ameaça as entregas do Jurong Aracruz é a qualidade da mão de obra local. “A indústria naval no Espírito Santo não existe”, disse o governador Renato Casagrande (PSB).

“Para nós é muito importante. Estaleiro é uma atividade nova no Espírito Santo. O estaleiro vai contratar muita gente, cerca de 5 mil pessoas, e manterá o mesmo número de empregados por muitos anos. Passaremos a ter uma atividade nova”, comemora o governador.

Com a vinda do Jurong, Aracruz, com 82 mil habitantes, vive um boom de investimentos. Até cinco anos atrás, 80% da arrecadação (cerca de R$ 300 milhões em 2011) vinha da produção de celulose pela Fibria (antiga Aracruz Celulose, fundada há 40 anos) e da exportação do produto pelo Portocel, porto privado.

Novos investimentos já começam a surgir

 A Petrobrás, que tem ao lado do Portocel o Terminal Aquaviário Barra do Riacho, planeja construir no município uma unidade de armazenamento de gás e um porto exclusivo. Um terceiro porto, da metalomecânica Imetame, também está em implantação, assim como uma fábrica de papel da Cartas Fabril.

O estaleiro Jurong comprometeu-se com a prefeitura de Aracruz e com o governo capixaba, em troca da cessão do terreno e de benefícios tributários, a formar mão de obra especializada e dar preferência aos moradores. Se não investir com urgência na qualificação de trabalhadores para a indústria naval, o Jurong Aracruz correrá o risco de não atender aos prazos de entrega das sondas.

Responsável pela construção de seis sondas para perfuração da camada do pré-sal para a Petrobrás, o estaleiro Jurong Aracruz ainda não deixou de ser um projeto.