>Entrevista Superintendente da Agência Nacional de Transportes Aquaviários (Antaq), Fernando Fialho

0
718
IMPRIMIR
>

O ex-presidente da Empresa Maranhense de Administração Portuária (Emap) Fernando Antonio Brito Fialho é o superintendente da Agência Nacional de Transportes Aquaviários. A Antaq é responsável pela definição das regras de desenvolvimento do setor portuário nacional e pela fiscalização da Lei 8.630/93, criada com o objetivo de modernizar dos portos brasileiros.

Em entrevista exclusiva a Revista Conexão Marítima, Fialho disse que seu mandato terá a missão de acelerar a liberação dos processos que ficaram parados no período em que o órgão esteve sem diretoria.”Primeiro, teremos que tirar o atraso do que está pendente, como liberações de arrendamentos, e segundo, planejar o futuro para caminhar na frente dos problemas e traçar estratégias que nos permitam antecipar algumas demandas, para melhorar as condições de trabalho nas instalações portuárias brasileiras”, disse o executivo.
Formado em Engenharia Civil, especializou-se em Gestão Empresarial, além de presidir a Emap entre 2003 e 2005.

O senhor assumiu a ANTAQ em Julho de 2006. Como o senhor encontrou a Agência?

Fialho: Assumimos a Antaq em um cenário, que ela infelizmente, estava sem diretoria há seis meses. Existiam muitos assuntos de diretoria que estavam atrasados. O primeiro passo foi identificar as prioridades da agência para podermos orientar nossos colaboradores. Decidimos algumas linhas de trabalho para a revisão de algumas normas, com a finalidade de aprimorar e melhorar cada vez mais a Antaq.

Focar mais a profissionalização?

Fialho: Também. Logo que assumimos, nomeamos 100 colegas concursados que estavam aguardando a nomeação. Isso ajudou a estruturar as sete unidades regionais que passaram a contar com funcionários para poderem funcionar.Criamos a Superintendência de Navegação Interior, para atuar fortemente nos estudos da navegação interior do país. Temos hoje quatro superintendências.A Superintendência de Administração e Finanças, da Navegação Marítima, da Navegação Interior e de Portos. Além disso, procuramos decidir claramenre as rotinas da agência. Elaboramos o Plano Anual de Fiscalização, que já foi implantado neste ano e estamos preparando o de 2008.

Na pratica, o que é esse plano?

F ialho: Tem como objetivo cuidar da regularização de empresas,regulamentar o setor que funcionava sem uma fiscalização precisa e presente. Passamos a fiscalizar como atividade básica da agência.

O que é prioritário na sua gestão?

Fialho: Primeiro definimos um rumo. Tenho tido a felicidade de trabalhar com uma diretoria que é muito profissional e possui um profundo conhecimento sobre os temas. Desta forma trabalhamos de forma integrada e isso é positivo, haja visto que as deliberações da diretoria na maioria das vezes tem sido consensuais.

A questão dos arrendamentos é polêmica. A Associação Brasileira dos Terminais de Contêineres (Abratec), afirma que, por lei, terminais privativos são aqueles onde carga própria é o principal e serviço para terceiros são complementares. Segundo a entidade, se mudar as regras do jogo, o governo, além de frustrar quem já investiu, irá afastar novos investidores. Qual a posição da Antaq a respeito?

Fialho: Estamos acompanhando todos os passos deste tema com muita atenção e cautela. Muitas afirmações são “apaixonadas” de ambos os lados. O papel da Antaq é retirar essas paixões das argumentações e tentar construir um caminho que seja interessante para o país. O Brasil, e isso não é diferente de outros países do mundo, tem tido uma baixa capacidade de investimentos em infra-estrutura, apesar de todo o esforço do governo. Neste mesmo cenário mundial existe uma grande oferta de capital privado e que tem a intenção de investir em infra-estrutura. Isso casa com a necessidade do Brasil em ampliar a sua infra-estrutura, porque o país cresceu muito e precisamos ter um cenário estável e atraente para o capital privado.

E quais são os caminhos para isso ser viabilizado?

Fialho: O primeiro é através de arrendamento dentro de áreas de porto público, de portos organizados, através de processos licitatórios que acabaram dando lorigem aos associados da Abratec. Mas também temos a outra vertente prevista em lei na 86.30 que é a dos terminais de uso privativo,que deu origem aos associados da Associação Brasileira dos Terminais Portuários (ABTP), e que esta ai dentro de um conjunto de players como a Vale do Rio Doce, Gerdau e recentemente com o processo de conteinerização que tem trazido o interesse de empresários de investir também em terminais privados para a movimentação de contêineres. No ponto de vista da legislação, ambos os casos tem amparo e o que estamos procurando é criar limites e condições iguais de competição. Queremos sim a competição entre eles. Isso trará uma redução do custo final, que quem paga é o cidadão brasileiro que compra qualquer produto importado. Defendemos uma maior oferta de serviços portuários, tanto em terminais de uso privativo, quanto em áreas de porto organizado. Isso vai gerar uma maior oferta o que trará benefícios para a sociedade.

Os empresários afirmam que a regulamentação das licitações foi feita há apenas dois anos, o que, em termos de prazo para grandes investimentos, é um período pequeno, uma vez que as licitações valem por períodos de 25 anos.

Fialho: Veja bem. Essa regulamentação não vem sendo feita a revelia. Estamos discutindo amplamente com o setor privado, com os trabalhadores, com a sociedade. Queremos promover aprimoramentos na legislação sem que isso venha prejudicar o investimento que já foi feito. Não é uma tarefa simples. É nessa linha de equilíbrio que vamos trabalhar. É um tema que envolve interesses econômicos de parte a parte que tem que ser maturados e avaliados com muito equilíbrio e tranqüilidade pela Antaq do ponto de vista técnico e jurídico. É necessário acompanhar a política de desenvolvimento do país preservandor as condições de competitividade. O que não vamos preservar é garantir que “não vais mais entrar ninguém porque esta bom assim”. Esse não é o papel da Antaq. Nossa missão é regulamentar, manter atrativo o setor para que venham mais investidores sabendo quais são as regras do jogo, que são as mesmas que os atuais investidores já estão jogando.

Muito se fala no renascimento da cabotagem no Brasil, mas pouco se faz. Quais seriam as ações prioritárias para realmente renovar a frota brasileira, em um país onde a indústria de construção naval está sem competitividade econômica e tecnológica?

Fialho: É verdade. Felizmente esta ocorrendo um grande programa de reestruturação da indústria naval brasileira. Gostaria de ressaltar alguns aspectos importantes em relação a cabotagem no Brasil.Temos também que atacar a questão da competitividade das empresas que operam a cabotagem no país e muitas delas com muita competência,aumentando a sua competitividade , trabalhando para que sejam cumpridos alguns artigos legais que há muito foram elaborados e que não vem sendo cumpridos tais como a equiparação do combustível para o mesmo valor que é para a navegação de longo curso. É mais caro fretar um navio para fazer um serviço na costa brasileira, do que fretar o mesmo navio para um país da Europa. Tem havido investimentos importantes nesta área, como o da Transpetro, da Login que que é uma subsidiária da Vale do Rio Doce , que vai construir e cinco navios para transportar contêineres, a Aliança Navegação não tem medido esforços para viabilizar um grande projeto que hoje abrange toda a costa brasileira e outras empresas que já operam e prestam serviços cada vez mais eficiente.

Antigamente se você queria transportar um contêiner, tinha que se preocupar em entregar a carga no porto, acompanhar a mercadoria, esperar que chegasse em outro porto e mandar buscar a mercadoria e tirá-la de dentro do contêiner. Hoje não.Hoje o serviço é porta a porta. Agora, temos algumas deficiências sérias no reaparelhamento de nossa frota. O Fundo de Marinha Mercante tem aprovado alguns projetos, mas necessitamos de muito mais recursos e alternativas. .Precisamos de navios mais novos e modernos, com custo operacional mais baixo.

Uma das alternativas não seria a importação de navios usados ?

Fialho: Essa alternativa pode ser viabilizada desde que isso esteja atrelado ao programa de reaparelhamento e que venha com restrições.Não pode ser uma importação indiscriminada, sem critérios.Quem reclama muito da falta de navios na costa brasileira é o setor do agronegócio que tem uma sazonalidade muito grande o que implica em uma demanda grande em determinados períodos e quase uma ausência de demanda em outros períodos. Isso tem que ser analisado com muita cautela para a indústria naval não ser prejudicada. É importante ressaltar que o governo federal tem feito um grande esforço através do Fundo de Marinha Mercante no sentido de valorizar a indústria naval brasileira. O que achamos é que pode haver complementarmente um programa para suprir algumas lacunas específicas de forma comprometidas a também em produzir navios no Brasil para que não haja a entrada de aventureiros que aproveitam do momento, vão embora, deixam uma lacuna e acabam com todo o trabalho que foi realizado.

Hoje no Brasil, os estaleiros não estariam mais preocupados, focados em plataformas e barcos de apoio encomendados pela Petrobras? Isso de certa forma não desestimula o armador a investir na cabotagem?

Fialho: Realmente os estaleiros tem focado na produção de barcos e plataformas para a Petrobras.Porque isso ocorre? É que havia uma grande demanda para esta área. É importante avaliarmos o cenário macroeconômico que o Brasil vive hoje. Não tinha muito sentido você falar em cabotagem em períodos de alta inflação.Com a estabilização da economia brasileira os empresários vem .adquirindo confiança em investir no setor. Já existem projetos consistentes na área de mineração e em outros setores da economia.

A abertura da dragagem dos portos brasileiros para empresas estrangeiras, a MP 393, faz parte de um pacote elaborado pela Secretaria Especial dos Portos comandada pelo ministro Pedro Brito. Qual a sua opinião a respeito? Vai ser a solução para o grande problema que é a dragagem nos portos brasileiros?

Fialho : O Brasil tem alguns problemas ligados a dragagem dos portos.A nossa avaliação é que isso ocorre não só por causa das empresas de dragagem existentes hoje no Brasil, até porque já algum tempo as resoluções da Antaq flexibilizaram a possibilidade da entrada de empresas estrangeiras no Brasil lhoje elas operam normalmente no Brasil. Eu compreendo a grande preocupação da Secretaria dos Portos em fazer um programa mais abrangente para este setor.A idéia é balizar os preços com critérios mais internacionais. Vamos ter um conjunto de investimentos interessante. É importante que existam projetos de licenciamento e gerenciamento ambiental da dragagem. Esses dois ‘ítens são os maiores problemas nesta área.

Batalhas em torno do impacto ambiental de várias obras, estão inviabilizando a expansão do modal hidroviário . O principal entrave são as ações na Justiça envolvendo organizações ambientalistas, o Ministério Público e as administradoras regionais. Como o senhor vê essa questão?

Fialho: Infelizmente isso ocorre por informações equivocadas. É é errado dizer que utilizar o transporte hidroviário é ambientalmente agressivo, muito pelo contrário. Em todos os países do mundo, na Europa,que tem uma alta consciência ambiental,implanta novos trechos de hidrovia a cada ano com ações claras voltadas para o meio ambiente.

Qual a avaliação que a ANTAQ faz do papel dos Conselhos de Autoridades Portuárias ( CAPs) ?

Fialho: A Antaq está desenvolvendo um projeto de valorização dos CAPs, que inclui a capacitação de presidentes dos conselhos. A idéia é de os presidentes se tornem agentes multiplicadores dentro dos CAPs. A Agência está treinando os conselheiros que representam o Governo Federal. Esse exemplo precisa ser acompanhado pelos outros segmentos, para que os conselheiros tenham condições de debater os problemas do porto com conhecimento da legislação e sem a excessiva defesa dos interesses do setor que representa. Os CAPs já têm uma atuação importante nesse sentido, mas, à medida em que seu papel for melhor compreendido, que os seus presidentes estejam mais preparados, essa contribuição será muito mais efetiva.O CAP é como o poder legislativo do porto, ao qual cabe harmonizar os interesses dos diferentes setores. O papel do órgão é propor estudos que sinalizem quais são os vetores de crescimento do porto. O órgão tem que ter a sensibilidade para se colocar à frente do planejamento das ações. Esse é, sem dúvida, um grande desafio, mas, com certeza, os bons gestores, as autoridades portuárias, irão usá-lo como um aliado.