Duas mães, dois pais: “Laços familiares estão mais fortes”

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Por Daniela Stefano

Há cinco anos, a Radio Nederland visitou a grande família dos irmãos Max e Robin van Gorp, que tinham então 3 anos e 8 meses, respectivamente, e viviam em duas casas, com suas duas mães e seus dois pais. Especial para a última edição do Europa Mix, a família se reuniu para contar como anda a experiência dos dois casais de homossexuais que educam seus filhos em comum.

Quando a Radio Nederland visitou a família de Max e Robin van Gorp pela primeira vez, educar os filhos em conjunto era, para pais e mães, uma experiência em construção. Agora, cinco anos mais tarde, os laços familiares estão mais sólidos: “Acho que a relação entre nós quatro (os pais e as mães) cresceu bastante. Nos tornamos amigos íntimos e conseguimos nos comunicar até sem palavras. E isso aconteceu por causa das crianças”, conta Jonatas de Lemos, o pai biológico.

Na certidão de nascimento, consta como mãe o nome de Annemiek van Gorp, a mãe biológica. Ao nascer, as crianças foram logo adotas pela companheira dela, Jeanine van Barlingen. Os pais, Jonatas de Lemos e Hubert Roza são os tutores dos meninos e atualmente possuem o direito adquirido de estar com eles. As crianças continuam vivendo a maior parte do tempo na casa das duas mães e dois dias por semana na casa dos dois pais. Nesse meio tempo, os pais mudaram de casa e agora vivem próximos das mães, na cidade de Utrecht. Mas, o que mudou nesse período?

 

A idéia


Jeanine van Barlingen é companheira de Annemiek van Gorp. Queriam ter filhos, mas precisavam de um doador de espermas. Consultaram um casal de amigos – Jonatas de Lemos e Hubert Roza – se um dos dois poderia ser o pai dos filhos delas, conforme explica Jeanine, a mãe não-biológica de Max e Robin:

“Perguntamos se Jonatas ou Hubert gostariam de ser doadores. Em princípio, não tínhamos preferência, e eles poderiam escolher quem seria o doador. Tínhamos combinado que Annemieke seria a mãe biológica.”

Para Annemieke van Gorp, desde o início seria importante que o doador também desempenhasse o papel de pai: “Sempre tivemos a idéia de que seria importante a presença de um pai na vida das crianças. Conhecemos histórias de pessoas que não tiveram pai e sabemos que, na prática, é melhor que uma criança tenha um pai por perto. E elas ganharam dois pais, o que é ótimo.”

O pai biológico


O casal masculino decidiu que Jonatas de Lemos seria o pai biológico. Jonatas é brasileiro e, na época em que decidiram ter o primeiro filho, Lemos morava há dois anos na Holanda e ainda estava indeciso se aqui era ou não lugar dele:

“Naquele tempo para mim estava muito difícil na Holanda, a aclimatização… e um grande argumento foi que pra mim seria interessante ser o pai biológico porque seria mais uma razão pra eu me identificar com o país. E funcionou: ter aqui alguém que possa chamar de filho me dá uma razão extra pra ficar”.

Isso não significa ser uma situação fácil de se aceitar. Afinal, esta não é uma família como a que o próprio Jonatas, por exemplo, cresceu:

“Porque você tem também que encontrar a si próprio um papel que combine com a sua idéia de ser pai e como esta construção, que é diferente da tradicional, tudo o que você ouve, do que se aprende do que é ser pai dos próprios pais ou da sociedade, não se aplica perfeitamente a esta construção.”

Mães têm guarda oficial


Juridicamente, na Holanda, apenas duas pessoas – não importa o sexo delas – podem se responsabilizar por uma criança. Quando duas mulheres têm uma relação e querem criar juntas uma criança, a mãe biológica ganha automaticamente a guarda da criança. A parceira dela, a mãe social, pode adotar a criança e desta forma, ser a responsável pela criança.

É o caso de Max e Robin. A mãe biológica, ou seja Annemiek, é a mãe deles. Jeanine adotou as crianças logo que nasceram e, assim, as duas têm a guarda das crianças. O pai biológico, Jonatas, e o pai emocional, Hubert, são os tutores dos meninos, ou seja, só podem ter a guarda das crianças caso aconteça algo com as mães. Assim, no caso desta família, na qual os pais não oficiais também desempenham papel importante na educação das crianças, tudo funciona na base da confiança entre os dois casais de homossexuais, conforme explica Hubert:

“Muitas vezes eu penso que eu não tenho nenhum direito sobre as crianças. Jonatas é o pai biológico, mas também não tem direito. Se as mães disserem: ‘Muito obrigada, funcionou, tchau’, o que pode acontecer, toda a confiança que temos entre nós, cai por terra. O que foi acordado, desde o início, é que nós, os pais, investiríamos atenção e energia na educação das crianças, mas também não iríamos reclamar direitos sobre as crianças, como por exemplo, querer que fiquem 50% do tempo em nossa casa. E nós também confiamos nas mães, que também nos dariam espaço para ficar com as crianças quando quisermos. Até agora, nossa família funciona muito bem.”

Tudo em dobro


Max e Robin, então, têm dois pais e duas mães, sendo que o casal masculino vive numa casa e o casal feminino em outra. Eles passam mais tempo na casa das mães, mas, a situação deles é diferente do caso de crianças que têm pai e mãe que, um dia viveram juntos e estão separados, conforme conta Jeanine:

“Se formos comparar com uma família em que os pais são separados, na verdade, isso pode ser muito difícil ou doloroso se as crianças não estão em casa. E para nós é exatamente muito positivo. O que nós duas não tínhamos pensado é o quanto as crianças são importantes também para Jonatas e Hubert. Eu vejo isso como um ‘extra’ para todos nós. O que acontece é que as crianças agora têm uma família muito grande. E Max não faz diferença, ele entende que todos nós somos seus pais, e as crianças estão acostumadas com isso.

Dois pais e duas mães significa também quatro avós e quatro avôs. Jonatas conta como foi a reação da família brasileira na primeira visita dos dois casais e o primeiro filho ao Brasil:

“A gente foi ao Brasil quando o Max tinha um ano de idade. E a reação da minha família foi fantástica. Uma criança muda comportamentos, idéias em relação à vida. Nós vamos agora mais uma vez para o Brasil, e o Robin vai completar um ano quando estiver lá… e eu estou muito curioso porque vai ser a segunda vez que meus pais vão ver o Max e vão ver também mais um, o Robin. E, agora, o Max tem três anos, já pode reagir mais ao ambiente.”