Diogo Mainardi volta à literatura com relato sobre a paralisia cerebral de seu filho

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O escritor Diogo Mainardi e seu filho Tito

No dia 30 de setembro de 2000, quando chegava ao hospital de Veneza, na Itália, o escritor Diogo Mainardi ouviu de sua mulher, Anna, que estava grávida, um receio sobre o parto.

Diante da fachada do prédio, uma gema da arquitetura renascentista projetada em 1489 pelo arquiteto Pietro Lombardo, Mainardi não se conteve: “Com esta fachada, aceito até um filho deforme”. Horas depois, um erro médico condenaria Tito, o filho mais velho do casal, a uma grave paralisia cerebral.

Um crente –ou supersticioso– poderia ligar os dois pontos por qualquer coisa próxima de compensação ou castigo divino. Mainardi ri.

“Deus, se existisse, seria muito burro de ter me dado Tito como castigo. Ele é a coisa que eu mais amo na vida.”

O tal amor a que ele se refere virou sua vida de ponta-cabeça. Nos últimos 12 anos, Mainardi passou a orbitar em torno do filho.

A elaboração a respeito do sentimento que colheu um autodefinido “anti-sentimental” de forma tão arrebatadora é o norte de “A Queda”, livro que o escritor lança nessa semana no Brasil.

“É um livro sobre o meu amor pelo meu filho e não sobre os sentimentos dele por mim, certamente mais baixos do que isso”, diz ele, ferino como à porta do hospital.

Na obra, ao longo de 424 tópicos, Mainardi, que em 2010 voltou a morar em Veneza, reconstrói a trajetória do primogênito desde o infortúnio até um auge recente do desenvolvimento do garoto.

Entrelaçado a isso, um sem fim de referências, fatos e personagens históricos, aparentemente insociáveis, se ligam à vida do filho, junto a elucubrações sentimentais.

O conjunto disso dá ao nascimento de Tito um caráter quase épico.

Baseado em indícios por vezes debochadamente manipulados, o escritor faz Napoleão Bonaparte, Adolf Hitler, Neil Young e Le Corbusier incorrerem em culpa ou compreensão do problema de Tito.

Para o leitor, o convencimento disso se dá por afeição tanto quanto pela reiteração desses laços, literariamente ao estilo do escritor austríaco Thomas Bernhard.

A pesquisa Mainardi diz não ter sido um sacrifício. “Os elementos para essa construção eu tinha ao meu redor. E a minha gasolina era o amor.”