As prefeituras fazem a festa com os royalties do petróleo

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Nem água, nem esgoto: sem rede pública, Raurison Souza, de Guamaré, teve de improvisar para ter água; a cidade tem o 20o maior PIB per capita do país

Por Daniel Barros e Patrícia Ikeda, de 

 No dia 2 de maio, o deputado federal Paulo Feijó (PR-RJ) subiu à tribuna da Câmara, em Brasília, para parabenizar a prefeitura de Campos dos Goytacazes, no Rio de Janeiro, por ter entregue à cidade o Centro de Eventos Populares Osório Peixoto — na verdade, um sambódromo.

Com dimensões equiparáveis às do Anhembi, na capital paulista, a passarela pode receber 40 000 pessoas, o equivalente a quase 10% da população de Campos. O sambódromo foi entregue em março para o seu Carnaval fora de época, com mais de um ano de atraso. Consumiu 80 milhões de reais, 10 milhões a mais que o previsto.

O dinheiro veio de uma fonte especial: os royalties dopetróleo, uma espécie de participação na receita obtida com a extração diária de milhares de barris na bacia marítima que leva o nome da cidade. Para Feijó, o sambódromo é um exemplo: “Isso é o dinheiro dos royalties bem aplicado, porque resulta em melhor qualidade de vida para a população”, disse o deputado, correligionário da prefeita Rosinha Garotinho, mulher de Anthony Garotinho, ex-governador fluminense.

Orávio de Campos, secretário municipal de Cultura, defende a mesma tese: “O Centro de Eventos Populares era uma necessidade do município. Não podia deixar de ser feito”. Como Campos é a cidade que mais recebe royalties do petróleo — quase 10 bilhões de reais na última década —, a impressão que se tem é que a prefeitura já resolveu problemas em áreas que costumam ser críticas, como saneamento, saúde e educação, e agora pode dedicar parte do caixa para tocar projetos mais festivos.

Não é bem assim. De 2000 a 2009, a cidade caiu da 17a para a 42a colocação no ranking de desenvolvimento dos municípios fluminenses. Elaborado pela Federação das Indústrias do Estado do Rio de Janeiro, o ranking associa indicadores de educação, saúde, geração de emprego e renda da população.

A situação da educação ilustra bem o motivo da perda de posições na lista. Campos tem 40 escolas e creches funcionando em casas alugadas — 17% da rede municipal. Localizada a 20 quilômetros do sambódromo, a Escola Municipal de Campo Novo funciona numa casa de três quartos que é alugada há 18 anos.

As 180 crianças que lá estudam em dois turnos contam com um único banheiro e não têm nenhum refeitório. A vizinha Escola Municipal Jacques Richer tem refeitório, mas ele está ocupado por uma sala de aula para abrigar os alunos de outra instituição, a Escola Municipal João Goulart, que estava caindo aos pedaços e foi demolida no final do ano passado.