Jornalista gaúcho relembra episódio do lixo enviado para os portos brasileiros

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Rumoroso caso ocorreu em 2009 e completou em julho 7 anos e é tema do livro “ Toma que o Lixo é Teu!”
Rumoroso caso ocorreu em 2009 e completou em julho 7 anos e é tema do livro “ Toma que o Lixo é Teu!”

Em julho de 2009, os inspetores da Receita Federal de Rio Grande descobriram o esquema ao deslacrarem 40 contêineres enviados ao porto do Rio Grande. Rastreando a documentação das empresas, foi possível detectar a irregularidade em outros 25 contêineres no porto de Santos (SP). Antes da descoberta do conteúdo em solo gaúcho, oito contêineres foram transportados, de carreta, de Rio Grande para o porto seco de Caxias do Sul (RS). Na documentação, a carga constava como polímeros de etileno para reciclagem. Na verdade, eram toneladas de lixo doméstico e hospitalar, como fraldas, seringas e preservativos. Um dos reservatórios levava brinquedos, com bilhetes informando: “Entregue estes brinquedos para as crianças pobres do Brasil. Lavar antes de usar”.

Quem nos narra um pouco dessa história é o jornalista Diniz Júnior, 37 anos na profissão e na época editor da Revista Conexão Marítima: “Essa história começa em um hotel localizado em Hamburgo, na Alemanha. Na época, acompanhava uma missão de jornalistas que tinha como  objetivo realizar uma reportagem no porto de Hamburgo. Foi quando representantes de algumas ONGs informaram que alguns países europeus estavam enviado lixo em contêineres para o Brasil, na verdade para vários portos e um deles seria Rio Grande (RS). Senti que começava a se desenhar uma grande reportagem. Quando retornei a  Rio Grande, a Receita Federal confirmou a história narrada em Hamburgo pelos ambientalistas”, disse.

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Crime com deboche: além do lixo domiciliar, brinquedos para crianças foram enviados aos portos nacionais Foto GUGA VOLKS

Para o jornalista Diniz Júnior, sete anos depois, o episódio ainda serve de reflexão. “Por que os países que impõem pesadas normatizações aos países mais pobres embarcam clandestinamente resíduos poluidores a estes mesmos países? Na minha opinião pressupõe-se que as autoridades sanitárias destes portos europeus não estão atentas ou que, se tiveram conhecimento, não interferiram, concordando com a barbaridade que estava sendo cometida. A importação de lixo doméstico vai além de um entrave legal e policial. São necessárias leis mais rigorosas para que essa inacreditável história não se repita”, frisou Diniz.

Sim, nós enviamos o lixo

Descoberta a irregularidade, o caso ganhou repercussão mundial. O Itamaraty reagiu ao episódio e o Reino Unido enviou ao Brasil um pedido de desculpa, e o material foi despachado de volta para a Grã-Bretanha em agosto de 2009, um mês depois, onde foi incinerado. A empresa Edwards WastePaper, da Grã-Bretanha, confirmou ter exportado ilegalmente 89 contêineres contendo cerca de 15 mil toneladas de lixo doméstico para o Brasil em 2009. Mesmo com o caso, os portos brasileiros registram, com frequência, a chegada de resíduos. O mesmo porto do Rio Grande registrou, em agosto de 2010, um carregamento de 22 toneladas de lixo vindas em um contêiner embarcado no porto de Hamburgo, na Alemanha.

Em outubro de 2011, o porto pernambucano detectou dois contêineres com cerca de 46 toneladas de lixo hospitalar proveniente dos Estados Unidos.O destino era uma empresa de Santa Cruz do Capibaribe, integrante do polo têxtil localizado na região do Agreste no Estado. Na verdade, eram lençóis e pedaços de tecidos com nomes de hospitais norte-americanos. O envio de resíduos deve respeitar a Convenção de Basileia – nome da cidade suíça onde o acordo foi firmado, em 1988. Ele estabelece mecanismos de controle sobre a movimentação de resíduos perigosos entre países para garantir a segurança ambiental e a saúde humana.

1393121_4953594736098_2055063164_nNa opinião de Diniz Júnior a sociedade de consumo não sabe o que fazer  com as toneladas de lixo que produz. Há os que defendem que cada país deva armazenar o próprio lixo e não exportá-lo. Outros alegam que em uma economia globalizada é inevitável a livre circulação de mercadorias, inclusive o lixo, e que esse comércio deva ser regulamentado, mas não proibido. “Na verdade, como em qualquer negócio que envolva muito dinheiro o que se deve combater é o comércio ilegal, as grandes máfias, e não transformar os países pobres em um lixão do mundo rico”, destacou Diniz.

O livro foi dividido em cinco partes: começa pelo lixo enviado pelos europeus; passa pelos portos marítimos e o desenvolvimento sustentável; mostra o maior Lixo Eletrônico do mundo em Gana e o Desmantelamento de Navios em Bangladesh que se tornou um Cemitério de Navios e de homens e encerra com o Fundo da Folia abordando a poluição dos oceanos. A  obra teve o apoio Cultural  da CMPC Celulose Riograndense e as fotos são de Guga Volks e das Ongs  Shipbreaking Platform, com sede em Bruxelas na Bélgica, da Rede de Ação da Basileia com sede em Seattle nos Estados Unidos, Fundo da Folia no Brasil e Greenpeace

“Toma que o Lixo é Teu!”

Páginas: 160

Vendas nas Livrarias Vanguarda em Rio Grande e Pelotas (www.livrariavanguarda.com.br)

FOTOS: GUGA VOLKS

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